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São Sebastião, Padroeiro de Lamego | Homilia de D. António Couto
SÃO SEBASTIÃO
PADROEIRO PRINCIPAL DA DIOCESE DE LAMEGO
- A nossa Igreja de Lamego celebra hoje jubilosamente o seu Padroeiro principal, São Sebastião, MÁRTIR, isto é, TESTEMUNHA, verdadeira testemunha de Jesus Cristo. O MARTÍRIO, isto é, o TESTEMUNHO, de São Sebastião aconteceu, com certeza, na grande perseguição movida aos cristãos pelo imperador Diocleciano, nos primeiros anos do século IV. E o TESTEMUNHO dado até ao sangue por São Sebastião espalhou-se por muitas comunidades cristãs, ou a elas deu origem, de acordo com o célebre aforismo de Tertuliano: «Sangue de mártires, semente de cristãos». De tal modo que em muitos lugares, na voz do povo, São Sebastião ficou conhecido simplesmente como «O MÁRTIR», aquele que deu a vida por Jesus Cristo, e que deu e dá vida, DADOR DE VIDA, a tantas comunidades cristãs.
- As páginas da Escritura Santa, que hoje, neste dia 20 de Janeiro, tivemos a graça de escutar, ajudam-nos a aprender a ser MÁRTIRES, isto é, TESTEMUNHAS, isto é, DADORES DE VIDA, no exato seguimento de Jesus Cristo e do nosso Padroeiro, São Sebastião.
- A grande lição do bocadinho do Discurso Missionário de Jesus no Evangelho Mateus (10,28-33) está atravessada pela confiança em Deus, nosso Pai, que cuida de nós em todas as circunstâncias. Daí a locução «não tenhais medo!», que soa no pequeno texto de hoje por duas vezes (Mateus 10,28 e 31). Daí, a coragem serena que deve mover o discípulo e enviado de Jesus a falar claro, à luz do dia ou sobre os telhados, em todas as circunstâncias. De resto, é óbvio que sendo o discípulo de Jesus por natureza missionário, não pode viver escondido nas catacumbas ou amuralhado no seu grupo de pertença. O cristão tem sempre pela frente o risco do mundo e da própria vida.
- Depois, para ilustrar as suas palavras, surge o recurso característico de Jesus às imagens simples da vida campestre. Dois passarinhos são vendidos por um asse, que é uma moedinha de cobre, pequenina, que valia 1/16 avos de um denário. O denário era o equivalente ao salário de um dia de um trabalhador. Portanto, do menor para o maior, à boa maneira rabínica, se Deus, nosso Pai, cuida desses passarinhos, pequeninos, quanto mais fará sentir a sua providência amorosa sobre nós (Mateus 10,29-31).
- O Antigo Testamento abre caminho para o Novo, e o Novo para o Antigo. Na excecional lição do Segundo Livro dos Macabeus, também hoje escutada, tanta vida se descobre. Contextualizo. No ano 167 a. C., o selêucida Antíoco IV Epifânio desencadeou uma violenta perseguição antijudaica (a primeira perseguição religiosa de que há memória na história), cujos ecos se podem ver no Segundo Livro dos Macabeus, Capítulos 6 e 7, um extraordinário díptico que mostra, no Capítulo 6.º, a fidelidade heroica do velho Eleazar, e, no Capítulo 7.º, a mesma atitude por parte dos sete jovens irmãos Macabeus e sua mãe. Foi este segundo episódio que hoje escutámos. A narrativa está cheia de heroicidade e de fé no Deus vivo. Estes sete jovens e sua mãe afirmam aqui, de forma clara, a Ressurreição, aludida em muitas outras passagens do Antigo Testamento. Mas vale sempre a pena recuperar o quadro de Eleazar, um ancião de 90 anos, que também afirma e defende corajosamente a sua fé perante os perseguidores pagãos. Os dois quadros, o do velho ancião e o dos sete jovens e sua mãe, formam um belíssimo díptico que devemos colocar em lugar bem visível para os olhos do nosso coração, como se fosse, e é, um quadro de família. A tinta dos quadros ou das narrativas do Livro dos Macabeus, citando nomes e acontecimentos verdadeiros, é também de teor edificante. O Livro de Daniel, escrito provavelmente no Outono do ano 164 a. C., lê os mesmos acontecimentos também com o objetivo de encorajar os judeus piedosos a permanecerem firmes na sua fé durante a perseguição do tirano Antíoco IV Epifânio. No dizer deste Livro (12,1-3), pessoas como Eleazar ou os sete jovens irmãos Macabeus e sua mãe são os mestres sábios e justificadores, isto é, DADORES DE VIDA. Estes MESTRES, estas TESTEMUNHAS, MESTRES porque TESTEMUNHAS, ensinam, não teorias, mas a vida verdadeira, dando a sua vida por amor: é assim que vencem os violentos, não opondo-se a eles, mas amando, isto é, dando a vida e DANDO VIDA, ensinando a viver. Estes novos sábios e dadores de vida são, diz o Livro de Daniel, as novas estrelas que brilham para sempre! Todas as outras, as do cinema, da canção, do futebol, as do próprio céu, são cadentes e decadentes.
- Portanto, ensina-nos a lição da Primeira Carta de São Pedro (3,14-17), também hoje escutada: «Estai sempre prontos, preparados, para dar, a quem vos pedir, a razão da esperança que há em vós» (1 Pedro 3,15. Dá-se a razão, como se dá o pão. Sem argumentação. Mas com a mão e o coração. Não é em vão que a lição da Carta de São Pedro diz «razão» com o termo grego lógos. Está bom de ver que o lógos bíblico não é nada nosso, não são os nossos raciocínios teóricos e abstratos. A razão que somos chamados a dar não é um objeto do nosso pensamento, mas uma PESSOA: Jesus Cristo, Filho de Deus, nascido de Maria, «feito Homem como nós e que veio habitar no meio de nós» (João 1,14). É Ele a razão, o lógos, «pelo qual tudo foi feito, e sem Ele nada foi feito» (João 1,3). Estar prontos, preparados, para dar a razão, o lógos, da nossa esperança, é estar prontos a dar a este mundo Jesus Cristo!
- De resto, amados irmãos, é de Jesus Cristo que este mundo precisa. É Jesus Cristo que as pessoas nos pedem. Foi Jesus Cristo que São Sebastião deu ao mundo no seu tempo. É Jesus Cristo que São Sebastião, Padroeiro da nossa Diocese, nos entrega hoje. Não como um valor a conservar e guardar com todas as cautelas em alguma gaveta ou cofre-forte. Mas para nós o entregarmos generosamente aos nossos irmãos. Quando celebramos um mártir, não sobra lugar para o acidental. É Jesus Cristo que um mártir tem nos olhos e no coração. É esta herança do essencial, sem estratégias ou malabarismos, que recebemos do nosso Padroeiro.
- Jovem soldado, jovem mártir, São Sebastião, ensina a tua Igreja de Lamego, que proteges, a estar sempre pronta, preparada e diligente para dar Jesus Cristo aos nossos irmãos que no-lo pedem. Ámen.
+ António, vosso bispo e irmão
Solenidade de São Sebastião | 20 de janeiro | Sé Catedral
Na próxima terça-feira, 20 de janeiro de 2015, a Igreja assinala a memória litúrgica de São Sebastião, Mártir dos primeiros tempos do cristianismo.
É o Padroeiro Principal da Diocese de Lamego, pelo que neste dia, pelas 18h30, o senhor Bispo, D. António José da Rocha Couto, presidirá, na Sé Catedral de Lamego, ao solene Pontifical para o qual todos os diocesanos estão convidados.
Celebra-se também hoje o aniversário de Ordenação Episcopal de D. Jacinto Botelho, Bispo Emérito de Lamego, ordenado a 20 de janeiro de 1996 e nomeado Bispo de Lamego a 20 de janeiro de 2000.
Santa Maria Mãe de Deus | Homilia de D. António Couto
SANTA MARIA, MÃE DE DEUS, RAINHA DA PAZ
- Oito dias depois da Solenidade do Natal do Senhor, que a liturgia oriental designa significativamente por «Páscoa do Natal», eis-nos no Primeiro Dia do Ano Civil de 2015, tradicionalmente designado como Dia de «Ano Bom», a celebrar a Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus.
- A figura que enche este Dia, e que motiva a nossa Alegria, é, portanto, a figura de Maria, na sua fisionomia mais alta, a de Mãe de Deus, como foi solenemente proclamada no Concílio de Éfeso, em 431, mas já assim luminosamente desenhada nas páginas do Novo Testamento.
- É assim que a encontramos no Lecionário de hoje. Desde logo naquela menção sóbria, e ousamos mesmo dizer pobre, com que Paulo se refere à Mãe de Jesus, escrevendo aos Gálatas: «Deus mandou o seu Filho, nascido de mulher, nascido sujeito à Lei» (Gálatas 4,4). Nesta linha breve e densa aparece compendiado o mistério da Incarnação, ao mesmo tempo que se sente já pulsar o coração da Mariologia: Maria não é grande em si mesma; é, na verdade, uma «mulher», verdadeiramente nossa irmã na sua condição de humana criatura. Não é grande em si mesma, mas é grande por ser a Mãe do Filho de Deus, e é aqui que ela nos ultrapassa, imaculada por graça, bem-aventurada, nossa mãe na fé e na esperança. Maria não é grande em si mesma; recebe de Deus essa grandeza.
- O Evangelho deste Dia de Maria (Lucas 2,16-21) guarda também uma preciosidade, quando Lucas nos diz que «todos os que tinham escutado as coisas faladas pelos pastores ficaram maravilhados, mas Maria GUARDAVA (synetêrei) todas estas Palavras (tà rhêmata), COMPONDO-as (symbállousa) no seu coração» (Lucas 2,18-19). Em contraponto com o espanto de todos os que ouviram as palavras dos pastores, Lucas pinta um quadro mariano de extraordinária beleza: «Maria, porém, GUARDAVA todas estas Palavras, COMPONDO-as no seu coração» (Lucas 2,19). Há o espanto e a maravilha que se exprimem no louvor e no canto, e há o espanto e a maravilha que se exprimem no silêncio e na escuta. Maria, a Senhora deste Dia, aparece a GUARDAR com carinho todas estas Palavras que acontecem, e não esquecem. O verbo GUARDAR implica carinhosa atenção, como quem leva nas suas mãos uma joia preciosa. Este GUARDAR atencioso e carinhoso não é um ato de um momento, mas a atitude de uma vida, uma vez que o verbo grego está no imperfeito, que implica duração. O outro verbo belo mostra-nos Maria como que a COMPOR, isto é, a «pôr em conjunto» (symbállô), a organizar, a harmonizar, para entender melhor. É como quem COMPÕE um Poema, uma Sinfonia, e se entretém a vida toda a trautear essa melodia e a conjugar novos acordes de alegria.
- Esta solicitude maternal de Maria, habitada por esta imensa melodia que nos vem de Deus, levou o Papa Paulo VI, a associar, desde 1968, à Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, a celebração do Dia Mundial da Paz. Hoje é já o 48.º Dia Mundial da Paz que se celebra, e o Papa Francisco apôs-lhe o lema «Não mais escravos, mas irmãos», que pediu emprestado a Filémon 16, mas que a Carta aos Gálatas, hoje por graça lida para nós, também trata muito bem (4,6-7). Na sua Mensagem para este Dia, diz-nos o Papa francisco que levantemos bem alto os nossos ideais, e não nos deixemos atolar no lamaçal desta «noite do mundo», em que tudo, à maneira de Babel e Sodoma, aparece indistinto, confuso e equivalente, sem rosto e sem rumo. Escravizar um ser humano é reduzi-lo a um objeto. E o Papa lembra que um ser humano é sempre um fim, e nunca um meio ou objeto, que possamos reduzir a três dimensões: comprimento, largura e altura, que assim podemos comprar ou vender, usar ou deitar fora a nosso bel-prazer. A alegria, a paz, o amor, a esperança, a verdade, a liberdade, a ternura, não são redutíveis a três dimensões, e, todavia, existem, e são mesmo o melhor da nossa humanidade. Às vezes, damos por nós a lutar apenas por campos e por casas, coisas e loisas de três dimensões. E diz-nos o profeta com uma forte invetiva: «Ai dos que juntam casa a casa, dos que acrescentam campo a campo, até que não haja mais espaço disponível, até serem eles os únicos moradores da terra!» (Isaías 5,8).
- De Deus vem sempre um mundo novo, belo, maravilhoso. Tão novo, belo e maravilhoso, que nos cega, a nós que vamos arrastando os olhos cansados pela lama. Que o nosso Deus faça chegar até nós tempo e modo para ouvir outra vez a extraordinária bênção sacerdotal, que o Livro dos Números guarda na sua forma tripartida: «O Senhor te abençoe e te guarde./ O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e te seja favorável./ O Senhor dirija para ti o seu olhar e te conceda a paz» (Números 6,24-26).
- Olhada por Deus com singular olhar de Graça foi Maria, também Pobre, também Feliz, Bem-aventurada, Santa Maria Mãe de Deus, que hoje celebramos em uníssono com a Igreja inteira. Para ela elevamos hoje os nossos olhos de filhos enlevados.
- Mãe de Deus, Senhora da Alegria, Mãe igual ao Dia, Maria. A primeira página do ano é toda tua, Mulher do sol, das estrelas e da lua, Rainha da Paz, Aurora de Luz, Estrela matutina, Mãe de Jesus e também minha, Senhora de Janeiro, do Dia primeiro e do Ano inteiro.
- Abençoa, Mãe, os nossos dias breves. Ensina-nos a vivê-los todos como tu viveste os teus, sempre sob o olhar de Deus, sempre a olhar por Deus. É verdade. A grande verdade da tua vida, o teu segredo de ouro. Tu soubeste sempre que Deus velava por ti, enchendo-te de graça. Mas tu soubeste sempre olhar por Deus, porque tu soubeste bem que Deus também é pequenino. Acariciada por Deus, viveste acariciando Deus. Por isso, todas as gerações te proclamam «Bem-aventurada»! Por isso, nós te proclamamos «Bem-aventurada»!
- Senhora e Mãe de Janeiro, do Dia Primeiro e do Ano inteiro. Acaricia-nos. Senta-nos em casa ao redor do amor, do coração. Somos tão modernos e tão cheios de coisas estes teus filhos de hoje! Tão cheios de coisas e tão vazios de nós mesmos e de humanidade e divindade! Temos tudo. Mas falta-nos, se calhar, o essencial: a tua simplicidade e alegria. Faz-nos sentir, Mãe, o calor da tua mão no nosso rosto frio, insensível, enrugado, e faz-nos correr, com alegria, ao encontro dos pobres e necessitados.
Que Deus nos abençoe e nos guarde,
Que nos acompanhe, nos acorde e nos incomode,
Que os nossos pés calcorreiem as montanhas,
Cheios de amor, de paz e de alegria,
Que a tua Palavra nos arda nas entranhas,
E nos ponha no caminho de Maria.
O amor verdadeiro está lá sempre primeiro.
O fiat que disseste, Maria, é de quem se fia
Num amor maior do que um letreiro.
Vela por nós, Maria, em cada dia deste ano inteiro,
Para que levemos a cada enfermaria,
A cada periferia,
Um amor como o teu, primeiro e verdadeiro.
Lamego, 01 de Janeiro de 2015, Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus, e 48.º Dia Mundial da Paz
+ António Couto, vosso bispo e irmão
D. António Couto, novo Bispo de Lamego
O novo bispo de Lamego, D. António Couto, tomou hoje posse da diocese, afirmando que conta com todos os membros da comunidade católica para desempenhar o seu papel, “entre Deus e o povo”.
“Quero muito ver o vosso rosto. Já sabeis que trago notícias de Deus e que conto muito com cada um de vós, para levar a todos os lugares e a todas as pessoas desta bela diocese este vendaval de graça e de bondade que um dia Jesus desencadeou”, disse, na homilia da missa que decorreu na sé lamecense.
Ao assumir a sede episcopal que lhe foi confiada em novembro de 2011 por Bento XVI, D. António Couto apresentou-se como um bispo que quer estar “pertinho de Deus, mas de um Deus que faz carícias ao seu povo, um Deus que ama e que perdoa” e “pertinho do povo, o suficiente para lhe entregar esta carícia de Deus”.
Na sua intervenção, o bispo de Lamego centrou-se sobre a passagem do Evangelho lida na celebração, afirmando que a missão de “anunciar” a vida e obra de Jesus implica, para os católicos, a missão de “ensinar, libertar, acolher, curar, recriar”.
Antes da homilia, o núncio apostólico em Portugal, representante diplomático da Santa Sé, deu posse ao novo bispo, lendo a bula de nomeação do Papa que encarrega D. António Couto de presidir à celebração e aos destinos da diocese localizada 400 km a norte de Lisboa.
“Por nosso supremo poder apostólico (…) te nomeamos bispo de Lamego, com todos os direitos e obrigações”, assinalava o texto, que antecedeu as palavras de saudação do bispo cessante, D. Jacinto Botelho.
Este prelado acolheu D. António Couto no Seminário Maior da diocese, acompanhado pelo presidente da autarquia, Francisco Lopes.
O novo bispo foi cumprimentado junto às portas da catedral pelo deão do Cabido (colégio dos cónegos) e pároco da Sé, cónego Delfim de Almeida.
No final da celebração, que pôde ser seguida por televisores colocados dentro e fora da sé, o novo bispo de Lamego cumprimentou os fiéis nos claustros, encaminhando-se a seguir para o Seminário Maior, onde janta com personalidades convidadas.
Aos 59 anos, D. António Couto torna-se o terceiro bispo residencial mais jovem nas dioceses portuguesas, deixando a Arquidiocese de Braga, na qual era auxiliar desde 2007.
Este responsável é membro da Congregação para a Evangelização dos Povos (Santa Sé) desde 2004 e presidente da Comissão Episcopal da Missão e Nova Evangelização (Conferência Episcopal Portuguesa).
A Diocese de Lamego, com cerca de 140 mil habitantes, foi criada por volta do ano 570 e é a única do país que não é sede de Distrito.
RJM/OC