Arquivo
Editorial da Voz de Lamego: Como Maria, com o olhar fixo em Jesus

A alegria do Evangelho, a Boa Notícia, proclamada no primeiro dia da Semana, o Domingo de Páscoa, é que Cristo, Filho de Deus vivo, está no meio de nós. As trevas foram vencidas pela luz. O medo deu lugar à confiança. Da morte ressurgiu a vida. O Crucificado ressuscitou. O amor venceu o pecado e a desolação.
Estamos em plena Semana Santa. A liturgia destes dias faz-nos peregrinos do Calvário e da Cruz, do amor e da entrega de Jesus, da vida nova que vai surgir.
Antes da Páscoa, a sexta-feira santa. A sexta-feira só se percebe com a Luz que irradia do túmulo de Jesus. A Ressurreição surge depois da Cruz e faz-nos perceber que chegamos à vida quando a gastamos a favor dos outros.
Olhando para os discípulos, para Judas e para Pedro, para as mulheres, para Simão de Cirene, para Pilatos e autoridades judaicas, para uma multidão instigada pelos líderes religiosos, como é que nos vemos diante de Jesus? Se tivéssemos estado lá, naquela ocasião, poderíamos ser qualquer um. Fortalecidos pelo testemunho de muitos, pelo encontro com o Ressuscitado, pelo acolhimento de Jesus, vivo, nas comunidades que se fazem Igreja, Corpo de Cristo, por certo estamos mais preparados para Lhe responder.
Ao longo da história da Igreja, muitos foram testados na sua fé. A esta distância, seria fácil julgar aqueles que não tiveram a força suficiente para resistir às ameaças, à perseguição, à exclusão, à tortura. Perante tamanha violência, teremos que reconhecer que não sabemos se resistiríamos ou não. Mas muitos foram capazes de seguir Jesus até à Cruz, até à morte. Na atualidade, continua a haver muitos mártires, pessoas excluídas do emprego, da habitação, expulsas do seu país, a serem torturadas e mortas, mas ainda assim, a persistirem na fé cristã.
Jesus, no Horto das Oliveiras ou no Calvário, diante da violência que se aproxima e a que Se sujeita, confia no Pai. Faça-se o que Tu queres.
Com Maria aprendemos a responder ao projeto de Deus, acolhendo a Sua vida, deixando que Ele nos preencha com a Sua Graça. Mais visível ou mais discretamente, Maria está por perto de Jesus, gerando-O e dando-O ao mundo, nos primeiros passos, ensinando-O a falar e a andar, e a rezar, e, juntamente com São José, mostrando como é importante viver em família, respeitar as pessoas idosas, ajudar os vizinhos, participar dos momentos de festa e dos momentos de dor. Em Jerusalém, Maria e José colocam o Menino sob a proteção de Deus. Mais tarde, Maria participa na alegria das Bodas de Caná e intervém junto de Jesus. Durante a Sua vida pública, os evangelhos mostram-na preocupada com o que d’Ele se diz. Em tantas situações, percebe-se que Maria está com os discípulos e com outras mulheres. Também no caminho agreste, duro, pesado do Calvário, junto à cruz, de olhar firme e coração apertado, Ela permanece diante de Jesus, Filho de Deus, e Seu Filho muito amado. É Mãe que chora, por todas as mães que perdem os seus filhos, e, como discípula, acolhe a vontade de Deus. E qual a vontade de Deus? Que sejamos felizes, sabendo que a felicidade passa pelo amor, pela entrega confiante, pelo serviço aos irmãos, ainda que exija esforço, dedicação e sacrifícios. Quem se sujeita a amar, sujeita-se a padecer.
Fixemos o nosso olhar no de Jesus, permitindo que Ele nos guie da Cruz à eternidade, da morte à ressurreição, da sexta-feira da Paixão ao Domingo de Páscoa, das trevas à luz, da tristeza à alegria do reencontro, do desencanto à paz que Ele nos dá.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/20, n.º 4602, 30 de março de 2021
Editorial da Voz de Lamego: Bendito é o fruto do teu ventre, Jesus

“A fragilidade humaniza a vida”, tematiza a vivência de mais uma Semana da Vida, proposta pela Igreja que caminha em Portugal, num contexto sui generis, de grande preocupação em defender, proteger e cuidar da vida, bem acentuada pela pandemia do novo coronavírus. Quem diria que aqueles que há poucos dias estavam apressados a legislar sobre direitos à morte estejam hoje a suspender direitos e liberdades a quem possa colocar em causa a saúde e a vida dos outros!
Para o cristão – seja onde for, na família, no desperto, na cultura, na política – é sempre oportuno a defesa e a promoção da vida, desde a sua conceção até à morte natural, não desistindo de encontrar respostas, ajudas, de comunicar esperança, de ser um apoio, privilegiando afetos e proximidade, aliviando a dor, procurando um sentido, mesmo que provisório, para continuar a viver bem. A morte boa não é uma opção de quem ama a vida, a opção é uma vida boa. Sem ser um valor absoluto, a vida é o primeiro dos direitos, é um valor fundante das liberdades, dos direitos e as garantias. Mais fácil é desistir. Cristão é confiar em Deus, entregar a Deus o esforço e a dedicação, e com Deus aliviar a carga que possa pesar sobre os demais.
A vida nem sempre é fácil. E há momentos em que as trevas são mais densas, como no tempo que atravessamos, mas nem por isso as pessoas ponderam desistir e, quando isso acontece nos outros, reclamam por vigilância, cuidado, respeito, responsabilidade pelos mais velhos, pelos que estão na linha da frente, na saúde, na alimentação, na manutenção da ordem, nas farmácias… respeito pelas normas! A liberdade, seja a 25 de abril ou a 25 de novembro, seja a 1 de maio ou a 10 de junho, não vai avante sem a discussão da responsabilidade e do compromisso de cuidarmos uns dos outros, mesmo que tentemos e consigamos arranjar exceções para nós!
Dentro da Semana da Vida, nos dias 12 e 13 de maio, haverá uma multidão de fiéis com os olhos colocados no Santuário de Fátima, que encherá de oração, de bênção e das intenções dos devotos, mas cuja presença física de milhares de pessoas, em nome da saúde de todos, no respeito pelas normas sanitárias e pelos avisos reiterados ao distanciamento social, contará com um número muito reduzido de pessoas, os celebrantes, funcionários do Santuário, os que ajudam na celebração e na transmissão da mesma para o mundo inteiro. A fé exige o serviço à vida, o cuidado pelos outros.
A vida nova que se gera em Isabel e que germina em Maria está envolvida no mistério de Deus. Isabel já tinha vivido tempo demais na desolação da infertilidade, mas Deus surpreende-a. Maria não sonhava com o que estava para vir, a alegria e o sofrimento atroz que a aguardariam, e Deus surpreende-a com um sonho, um projeto de vida que a envolve com a humanidade inteira.
Maria é a Senhora da esperança e da alegria, com ela Deus faz com que a humanidade seja enxertada no Seu sonho de amor e de paz, de bênção e de comunhão.
«Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre» (Lc 2, 42). Esta é a maior esperança e o fundamento de toda a alegria: Deus connosco. E luz para caminharmos neste tempo.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 90/24, n.º 4559, 12 de maio de 2020
TERRA E FECUNDIDADE | Editorial Voz de Lamego | 3 de maio de 2016
A Voz de Lamego desta semana destaca, entre outras temáticas, o encontro nacional da Asel, a Visita Pastoral de D. António Couto na Zona Pastoral de Sernancelhe, em concreto em Tabosa da Cunha e Ponte do Abade, a Jornada Jubilar dos Cursilhos de Cristandade, e a entrevista com o Pe. João Carlos, Pró Vigário Geral, sobre a mais recente Exortação Apostólica do Papa Francisco, “A Alegria do Amor”…
Por sua vez, o Pe. Joaquim Dionísio, no Editorial fala de terra e fecundidade, mas sobretudo de Maria, a Terra sagrada da Igreja. Boa leitura, aqui está o pórtico da edição desta semana da Voz de Lamego:
TERRA E FECUNDIDADE
O mês iniciado convida a contemplar Maria que, entre outros títulos, nos habituámos a apelidar como Mãe de Misericórdia, certos de que “a doçura do seu olhar nos acompanha” (MV 24).
Nas famílias e nas comunidades, a sós ou em grupo, dentro de casa, da igreja ou da capela, pela estrada fora ou num santuário, a vivência cristã destes dias é marcada pela devoção mariana.
Alguns Padres chamaram a Maria “terra sagrada da Igreja” para sublinhar a sua humana e pronta disponibilidade para servir, bem como a sua humilde fecundidade para acolher e frutificar. Porque a fecundidade é sempre fruto de uma escuta atenta e de uma contínua vontade de conversão. Rezar é também deixar-se assumir Palavra semeada.
Foi assim que Maria fez: ofereceu-se a si própria como terra, pôs-se à disposição, deixou-se usar e consumir para ser transformada. Assumindo-se como “serva do Senhor”, parece que se apaga, mas, na verdade, a sua dádiva permitirá ser “louvada por todas as gerações”.
Daí que, neste e noutros meses, possamos aprender com ela a tornarmo-nos “terra fecunda para semente” que é a Palavra. E isso nem sempre é fácil e cómodo.
Uma peregrinação de quilómetros é exigente, cumprir uma promessa de joelhos é difícil, oferecer velas e flores demonstra carinho… mas a verdade é que o louvor a Maria pode concretizar-se, sobretudo, por esta disponibilidade para acolher a Palavra e oferecer-lhe condições para frutificar. A oração diária poderá passar também pela meditação da Palavra de Deus, por um sério exame de consciência, pelo identificar das lacunas e, mais importante, pela resolução tomada e assumida.
No meio do activismo em que, às vezes, nos enredamos, Maria ensina-nos que não somos um “produto acabado” e que o crescimento individual, comunitário, eclesial se concretizará se nos assumirmos como “terra sagrada para a Palavra”.
in Voz de Lamego, ano 86/22, n.º 4361, 3 de maio de 2016
MAIS MÃE QUE RAINHA | Editorial Voz de Lamego | 5 de maio de 2015
O mês de Maio é dedicado especialmente a Maria. O Editorial, da responsabilidade do Pe. Joaquim Dionísio, Diretor do nosso Jornal diocesano, Voz de Lamego, foca-se precisamente em Maria, mais Mãe que Rainha, e na sua simplicidade de vida.
Pastoralmente, o mês de Maio é um dos meses mais preenchidos com atividades pastorais: encontros, caminhadas de oração, peregrinações, festas da catequese, Fátima Jovem, Jornadas Diocesanas da Juventude…
MAIS MÃE QUE RAINHA
Maio é sinónimo de Maria, a Mãe de Jesus e da Igreja que se desdobra em iniciativas para a louvar e lhe dirigir preces. E a Mãe a todos acolhe, de todos se ocupa e por todos intercede.
Diante do culto que lhe é devido, importa sublinhar a sua proximidade e ter consciência de que Maria levou, na terra, “uma vida semelhante à do comum dos homens, cheia de cuidados domésticos e de trabalhos” (AA 4). Por isso, e tal como lembrou Sta. Teresinha, “é preciso ver a sua vida real e não a sua suposta vida… E a sua vida real devia ser absolutamente simples”.
Maria partilhou a humilde situação social da maioria das mães do povo e viveu “sem pompas nem circunstâncias”, pertencendo ao grupo dos pobres e excluídos… As privações, o trabalho e a incerteza do depois marcaram a vida que viveu naquela aldeia pequena e pobre, rodeada de gente “socialmente insignificante”. Ela não foi rainha em reinos deste mundo, mas esposa e mãe de operários. E a santa francesa acrescentava: “Sabe-se perfeitamente que a Santa Virgem é rainha… mas ela é mais mãe do que rainha”.
M. Unamuno recorda-nos que “os jornais nada dizem da vida silenciosa dos milhões de seres humanos sem história que, em todas as horas do dia e em todos os países do globo, se levantam a uma ordem do sol e vão aos campos continuar o obscuro e silencioso trabalho quotidiano e eterno… Os que fazem barulho na história levantam-se sobre a imensa humanidade silenciosa”.
Assumindo-se como “serva do Senhor” e protagonizando um sim que a singulariza, a mãe de Jesus é exemplo e modelo de tantos e tantos que, discreta e decisivamente, contribuem para a vida.
in Voz de Lamego, n.º 4312, ano 85/25, de 5 de maio de 2015