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Archive for Outubro, 2021

Editorial Voz de Lamego: Levantai-vos! Vamos! Caminhemos juntos!

O tema escolhido pelo nosso Bispo e proposto a toda a Diocese de Lamego – Levantai-vos! Vamos! (Mt 26, 46) – coloca-nos em pleno mistério pascal. Depois da Ceia, no Jardim das Oliveiras, Jesus ora, uma e outra vez, para que Se faça a vontade do Pai, apesar do sofrimento que se entrevê, aquela hora tenebrosa que se vislumbra e que Ele sente na pele, no corpo, na alma. Os discípulos adormecem. É noite! Jesus desperta-os, uma e outra vez, e finalmente chama-os.

Ele está com eles, Ele está sempre connosco. Não estamos sós, não caminhamos sozinhos. O chamamento é claro: Levantai-vos! Vamos. Mesmo quando Jesus nos diz: Ide, é um “ide” em que Ele vai connosco. Ide, eu estarei convosco até ao fim dos tempos!

Após a ressurreição, ainda não inteiramente anunciada, no caminho de Emaús, Jesus faz-Se ouvir e faz-Se ver. Iam dois discípulos, desanimados, cabisbaixos, quase a murmurar, desencantados com o que tinha sucedido naqueles dias. Jesus aproximou-Se deles e pôs-Se com eles a caminho. Perceber-se-á que Ele é o caminho. Eles regressavam para se refugiar em casa; Jesus anuncia-Se, caminha com eles, entra com eles em casa e senta-Se com eles à mesa e, depois da bênção e da distribuição do pão, deixam de O ver. (cf. Lc 24, 13-35). Quando deixam de O ver, exteriormente, já Jesus os habita interiormente! Já não necessitam dos olhos físicos, mas do coração e, por conseguinte, a noite deixa de amedrontar, pois logo se levantam e regressam a Jerusalém, à comunidade dos discípulos.

Um Plano Pastoral aponta metas e vivências, faz-nos assentar os pés no chão para que aos ideais juntemos momentos, instantes, celebrações, encontros, tempos de oração e de reflexão, de formação e convívio. Não é possível traduzir a vida, o amor, se não por gestos, abraços, comunicação, sorrisos, pelas lágrimas e pelas palavras, na entreajuda, na prática das obras de misericórdia (corporais e espirituais), no respirar das bem-aventuranças, na atualização concreta dos Dez Mandamentos, sintetizados e explicitados no mandamento novo do amor: amais-vos uns aos outros como Eu vos amei.

A Diocese não é uma ilha, como o não são as paróquias, os movimentos, as associações, departamentos, serviços ou comissões. Estamos inseridos num país, a Igreja em Portugal, e no mundo, a Igreja Universal, procurando que haja valores, princípios, orientações e até linhas programáticas comuns. A este propósito vale a pena relembrar que estamos em Sínodo, convocado pelo Papa Francisco e inaugurado no fim de semana de 9 e 10 de outubro, no Vaticano, e na maioria das dioceses do mundo, no dia 17 de outubro.

O Sínodo dos Bispos 2021-2023 é um caminho que nos convida a todos, na escuta e no diálogo, na oração e na reflexão, para que, chegados a outubro de 2023, o caminho que percorremos em conjunto, com as dúvidas e interrogações levantadas, com as propostas e orientações sugeridas, possam ser debatidas, para que: o que a todos diz respeito seja por todos rezado e refletido. O tema do Sínodo: “Por uma Igreja Sinodal, comunhão, participação, missão”. Concluía o Pe. Diamantino Alvaíde, na admonição inicial, na Eucaristia de abertura do Sínodo, na Sé de Lamego: “Para uma Igreja sinodal: o Papa Francisco conta com a nossa comunhão; a Igreja espera a nossa participação, e Deus pede a nossa missão”.

No ano de 2023, realizar-se-ão as Jornadas Mundiais da Juventude, em Portugal, com o centro em Lisboa. O lema escolhido pelo Papa: «Maria levantou-se e partiu apressadamente» (Lc 1, 39) está, de algum modo presente no lema pastoral da nossa diocese. Por sua vez, o Movimento da Mensagem de Fátima servir-se-á de um lema semelhante: “Levanta-te! És testemunha do que viste!”

Levantemo-nos! Vamos! Jesus vai connosco!

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/48, n.º 4630, 27 de outubro de 2021

Entrevista com Fábio Cecílio, o nosso campeão mundial de futsal

Reconhecido jogador de futsal, natural de Tabuaço, onde despertou para esta modalidade, mormente fazendo parte da AJAB (Associação Juvenil Abel Botelho), numa equipa que se batia com as melhores formações. Começou por volta dos 14 anos e é há 14 anos que tem vindo a encantar os adeptos deste desporto, despertando o interesse dos maiores clubes portugueses, a começar no Braga, depois o Benfica, onde jogou seis temporadas, e, na nova temporada, novamente no Braga. Ganhou diversos troféus, ao nível do clube, mas também da seleção. Foi campeão europeu e, no passado dia 3 de outubro, campeão do mundo. Portugal bateu a poderosa Argentina, e detentora do título de campeã mundial, por 2-1.

Obrigado, Fábio, por nos cederes um pouco do teu tempo para falares connosco.

VL – Quatro segundos para acabar a final do mundial, entre Portugal e Argentina, quando a bola foi ao poste. Que pensaste nesse momento? Vamos ser os novos campeões do mundo ou isto só acaba quando o árbitro acabar?

FC – O jogo só acaba aos 0 minutos, mas eu estava confiante que ia dar para nós. O sentimento era mesmo que íamos sair daquele jogo como campeões do Mundo.

VL – Quando o árbitro apitou para o final, que sentiste? Quais as emoções? Algum pensamento concreto? Quererias estar em algum lado nesse momento?

FC – Quando começou o campeonato do mundo, claro que sonhava em sair campeão, mas sabia que seria bastante difícil. Chegar à final foi algo inédito, que nunca tinha acontecido e ganhar o último jogo ainda é algo inacreditável. Às vezes ainda não acredito que é verdade.

VL – Como descreverias os momentos que se seguiram? Com a família? Com os adeptos? A chegada a Portugal?

FC – Primeiro festejámos em equipa, depois com os incríveis adeptos que nos acompanharam ao longo de todos os jogos. De seguida, fomos ter com a família que estava presente no pavilhão e aproveitar para festejar… já não os via há um mês. Na verdade, foram dois meses de estágio muito difíceis, mas tudo compensa. A chegada a Portugal foi emocionante. Estar no nosso país, rodeado de portugueses a festejar um título que tanto ambicionámos.

VL – Um momento também importante, pelo seu simbolismo, foi a receção que na segunda-feira tiveste no Palácio de Belém, com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa. Que reténs deste encontro? Nos cumprimentos pessoais, que é que o Presidente vos diz?

FC – Ir ao Palácio de Belém é sinal de que o nosso trabalho está a ser reconhecido e de que deixámos tantos milhões de portugueses orgulhosos de nós e da nossa modalidade. As palavras do Sr Presidente da República no seu discurso foram muito motivadoras. No abraço que nos deu a cada um de nós, transmitiu que está é estará sempre connosco.

VL – Numa vertente mais honorífica, és Comendador da Ordem de Mérito, comenda atribuída aquando da vitória de Portugal no europeu e, agora, Comendador da Ordem Infante D. Henrique. Que significado atribuís a estas insígnias?

FC – Ter estas insígnias significa que estamos a fazer bem o nosso papel. Estamos a representar bem o nosso país e a dar a conhecer ao mundo inteiro e, principalmente, estamos a honrar Portugal.

VL – Em 2018, Portugal foi campeão europeu de Futsal, modalidade que continua em expansão e a mostrar que os portugueses estão na primeira linha. Diferenças de vencer o europeu e o mundial? Que foi mais fácil ou que vos/te deu mais gozo?

FC – São vitórias diferentes. O Campeonato Europeu de Seleções foi o primeiro. Sonhei muito com isso e sempre achei que iria ser muito difícil de alcançar, mas conseguimos e admito que nos deu muita força para acreditar que o Mundial era possível. O Mundial tem muitas seleções em competição, mais do que o Europeu e, claro, estão sempre as melhores equipas do mundo, o que faz com que tenha um sabor especial.

VL – A seleção portuguesa de futsal, já tinha chegado a um terceiro lugar, mas não a uma final mundial. Em que momento percebeste, e os teus colegas, que a final era possível?

FC – Nós sempre acreditámos que era possível porque tínhamos e temos qualidade para isso. O jogo contra a Espanha foi o jogo que me fez acreditar ainda mais, porque foi um jogo difícil, intenso em que começámos bem, onde nos debatemos bem. Na segunda parte sofremos 2 golos e ainda assim acreditámos até ao último segundo e conseguimos dar a volta. Espanha é uma seleção com muitas conquistas, incluindo 2 campeonatos do mundo e nós conseguimos ganhar esse encontro e passar para as meias finais. Aí, já tinha um sentimento de que estava mais perto de sermos campeões.

VL – Mais difícil o trajeto de apuramento ou a fase final do campeonato do mundo?

FC – Sinceramente, ambos são difíceis. Todos os jogos são para ganhar e todos vão com esse objetivo. Não há margem para falhas em nenhuma ocasião.

VL – E depois do mundial vitorioso, o que se segue, a nível pessoal?

FC – Depois do mundial e de dois meses intensos, o que sabe bem é estar com a família e festejar com eles. Não há muito tempo para aproveitar, pois a vida segue e o clube precisa de nós.

VL – Como é que um jovem de Tabuaço, interior norte, foi parar ao palco do mundo? Achas que os jovens do interior poderão sonhar, no caso do futsal, em ingressar em clubes que militam no primeiro escalão, como Braga, Benfica, Sporting?

FC – Claro que sim! Felizmente a nossa vila tem muitos jogadores com um excelente percurso em que passaram por clubes “grandes” e espero que todos sejam uma inspiração para os jovens do interior. Tudo é possível, basta acreditar e lutar por isso.

VL – Segundo sabemos, o percurso até fazeres um contrato profissional, não foi nada fácil. Queres falar-nos como começou este sonho do futsal, do gosto pela bola até te tornares federado?

FC – É uma história muito longa. Comecei tarde a jogar futsal pela AJAB e, apesar de ser um sonho de miúdo, nunca acreditei que fosse possível. A verdade é que no momento em que planeava emigrar, quando terminei os estudos, surgiram alguns clubes interessados em mim. Fui para o Sporting Clube de Braga/AAUM e tornei-me profissional quando fui para o SL Benfica.

VL – Como conciliavas o futsal, os estudos, e o trabalho no campo?

FC – Não foi nada fácil. Eu levantava-me por volta das 5h da manhã e ia para o campo trabalhar. Depois almoçava e ia para a escola ter aulas. No final do dia, havia treino. Não foi fácil, mas eu precisava de o fazer. Precisava de ter o meu dinheiro, precisava de estudar para ter um futuro e, claro, precisava do futsal.

VL – Como é que te adaptaste à cidade e a Braga, na primeira passagem?

FC – O primeiro ano foi de adaptação. Eu praticamente nunca tinha saído de Tabuaço, muito menos viver fora e sozinho. Foi complicado até porque não tinha carro e, apesar de ser perto de Tabuaço, era muito difícil ir a casa visitar a família.

VL – Depois de dois anos no Braga, o desafio seguinte foi o Benfica, onde jogaste durante seis temporadas. Foi mais fácil a adaptação no Benfica? Maior visibilidade, maior exigência?

FC – O primeiro ano também não foi fácil a adaptação à cidade, não propriamente ao clube, mas à cidade. Calhou ir viver para o centro de Lisboa, na zona da Graça e, por isso, não foi fácil, mas ao longo do ano fui-me adaptando e conhecendo. Acabei por gostar muito. Tanto o Braga/AAUM como o SL Benfica são clubes que querem vencer, tal como eu.

VL – Como viveste o confinamento, devido à pandemia? Como é que a modalidade lidou com esta situação?

FC – No momento em que tudo fechou, não houve muito a fazer. Fomos para casa, ficámos fechados e a modalidade parou nos pavilhões. O treino continuou cada um em sua casa. Tínhamos que nos manter ativos. Claro que não foi fácil. É muito diferente treinar em casa com o espaço que temos, mas depois tudo voltou ao normal, felizmente.

VL – Uma mensagem para os jovens de Tabuaço ou deste interior onde se situa a diocese de Lamego. FC – Costumo batalhar sempre em três palavras: trabalho, dedicação e persistência. Se têm sonhos, seja qual for, nunca desistam. Tudo é possível! Mesmo ser do interior e ganhar um Campeonato da Europa ou do Mundo. É possível!

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Editorial Voz de Lamego: Como combater a solidão? Alugar amigos

A edição de 5 de outubro do jornal I destacava em primeira página: “Alugar amigos para combater a solidão”. Como subtítulo: “A moda começou no Japão e já chegou aos EUA. Avós japonesas andam a assaltar lojas para serem presas”.

As tecnologias aproximaram as pessoas, fizeram com que o mundo parecesse uma aldeia global. Na Carta Encíclica “Caritas in Veritate”, Bento XVI chamava a atenção: “a sociedade cada vez mais globalizada torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos” (19). Na mesma linha, o Papa Francisco tem contraposto a era da globalização à globalização da indiferença. Temos acesso a muitas informações, mas isso já não nos comove. Com efeito, a exposição da violência em excesso, da pobreza, da miséria, da corrupção, dos crimes horrendos, tornou-nos insensíveis. O que nos chocava tornou-se banal, já não mexe connosco.

Esta moda, de alugar amigos, começou no Japão e chegou a Portugal em 2015. E, pelos vistos, está em crescendo nos EUA. Há empresas que alugam amigos. O preço pode ir de 10 a 50 euros por hora. Um amigo, um familiar, um colega… o que precisares, a empresa arranja-te um substituto, um estranho, ao ponto de ajudar a organizar uma festa, permitindo, depois ou na hora, a publicitação de uma vida faustosa e interessante, nas redes sociais, para que os outros possam ver e invejar.

A solidão é um cancro que está espalhado na sociedade atual e que continua em plena expansão. As distâncias foram encurtadas com os meios digitais, mas, por outro lado, verifica-se que estes meios isolaram ainda mais as pessoas. Por um lado, facilitam a comunicação, o trabalho, amenizaram os confinamentos. Se um filho estiver no outro canto do mundo é possível vê-lo, ao vivo e a cores. Um filho, um neto! Esbate-se a saudade! Mas continua a ser uma substituição.

O ser humano precisa do toque como de pão para a boca, precisa de cheirar e sentir o aroma do outro, de abraçar (ser abraçado), beijar ou apertar as mãos. Este contacto que faz-nos humanos, faz-nos sentir vivos e frágeis ao mesmo tempo, necessitados e completos. Por outro, o mundo digital facilita a ausência, o escondimento, a solidão… eu frente a um ecrã, vejo o mundo todo, procuro o que me interessa, descarto e dispenso o que é diferente, o que me desafia ou incomoda. Se trabalho a partir de casa, para quê sair, encontrar-me com amigos, com os colegas de trabalho para beber uns copos?! Mostro aquilo que quero, subtraio, para os outros, a parte de mim que não gosto.

A pandemia suscitou uma enorme solidariedade, ainda que também os medos se tivessem multiplicado. Mostrou muita miséria, material, cultural, espiritual. Suscitou compaixão. Mostrou pessoas e comunidades isoladas, sem meios de comunicação ou acesso a bens de primeira necessidade ou a prestação de cuidados médicos. As pessoas isolaram-se e algumas habituaram-se a viver como ilhas isoladas, tendo acesso ao mundo inteiro, a partir do sofá, da cozinha, do escritório. Multiplicaram-se os esgotamentos, os estados depressivos, a ansiedade, a acomodação. O regresso a alguma normalidade, ao que tudo indica, parece estar complicado. Há pessoas a ameaçar trocar de emprego para ficarem em teletrabalho!!! Há laços que estão a ser destruídos, há contactos que desapareceram, interdependências saudáveis e enriquecedoras que cederam à preguiça, à desconfiança, ao comodismo egoísta.

Admiramo-nos que num restaurante, num almoço ou jantar de família, os membros estejam sozinhos, cada um diante do ecrã do telemóvel, a fazer likes, a ver notícias, a jogar, a instagramar o momento. Antes saía-se para arejar, conviver, para que, em ambiente diferente, a família pudesse dispor de mais tempo de qualidade! Agora sai-se e continua-se a ver o mesmo mundo que via em casa! Estivemos tanto tempo diante de ecrãs que já não conseguimos libertar tempo para estarmos uns com os outros!

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/47, n.º 4629, 20 de outubro de 2021

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Editorial Voz de Lamego: Igreja em sínodo, Igreja à escuta

No passado sábado, 9 de outubro, o Papa Francisco deu início à XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, sob o tema: “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”. O sublinhado do Papa Francisco: “As assembleias do Sínodo revelaram-se um instrumento válido para o conhecimento recíproco entre os bispos, a oração comum, o confronto leal, aprofundamento da doutrina cristã, reforma das estruturas eclesiásticas, promoção da atividade pastoral em todo o mundo”.

Durante o seu pontificado realizaram-se duas assembleias sinodais sobre a Família (2014 e 2015), uma assembleia dedicada aos jovens (2018) e um sínodo especial para a Amazónia (2019), e agora sobre a sinodalidade da Igreja.

Vale a pena reler algumas passagens da reflexão do Papa na abertura do Sínodo.

Três palavras chaves: comunhão, participação, missão. “Comunhão e missão são expressões teológicas que designam – e é bom recordá-lo – o mistério da Igreja. O Concílio Vaticano II esclareceu que a comunhão exprime a própria natureza da Igreja e, ao mesmo tempo, afirmou que a Igreja recebeu «a missão de anunciar e instaurar o reino de Cristo e de Deus em todos os povos e constitui o germe e o princípio deste mesmo Reino na terra» (Lumen gentium, 5)… a terceira palavra: participação. Comunhão e missão correm o risco de permanecer termos meio abstratos, se não se cultiva uma práxis eclesial que se exprima em ações concretas de sinodalidade em cada etapa do caminho e da atividade, promovendo o efetivo envolvimento de todos e cada um”.

Três riscos: formalismo, intelectualismo, imobilismo. “O primeiro é o risco do formalismo. Pode-se reduzir um Sínodo a um evento extraordinário, mas de fachada, precisamente como se alguém ficasse a olhar a bela fachada duma igreja sem nunca entrar nela… Porque às vezes há algum elitismo na ordem presbiteral, que a separa dos leigos; e, no fim, o padre torna-se o «patrão da barraca» e não o pastor de toda uma Igreja que está a avançar…Um segundo risco é o do intelectualismo (da abstração, a realidade vai para um lado e nós, com as nossas reflexões, vamos para outro): transformar o Sínodo numa espécie de grupo de estudo, com intervenções cultas mas alheias aos problemas da Igreja e aos males do mundo; uma espécie de «falar por falar», onde se pensa de maneira superficial e mundana, alheando-se da realidade do santo Povo de Deus… Por fim, pode haver a tentação do imobilismo: dado que «se fez sempre assim» – esta afirmação “fez-se sempre assim” é um veneno na vida da Igreja –, é melhor não mudar. O risco é que, no fim, se adotem soluções velhas para problemas novos: um remendo de pano cru, que acaba por criar um rasgão ainda maior (cf. Mt 9, 16). Por isso, é importante que o caminho sinodal seja verdadeiramente tal, que seja um processo em desenvolvimento; envolva, em diferentes fases e a partir da base, as Igrejas locais, num trabalho apaixonado e encarnado, que imprima um estilo de comunhão e participação orientado para a missão”.

Três oportunidades. “A primeira é encaminhar-nos para uma Igreja sinodal (1): um lugar aberto, onde todos se sintam em casa e possam participar. Depois o Sínodo oferece-nos a oportunidade de nos tornarmos Igreja da escuta (2): fazer uma pausa dos nossos ritmos, controlar as nossas ânsias pastorais para pararmos a escutar. Escutar o Espírito na adoração e na oração…. uma Igreja da proximidade. O estilo de Deus é proximidade, compaixão e ternura. Deus sempre agiu assim. Se não chegarmos a esta Igreja da proximidade com atitudes de compaixão e ternura, não seremos Igreja do Senhor… uma Igreja que não se alheie da vida, mas cuide das fragilidades e pobrezas do nosso tempo, curando as feridas e sarando os corações dilacerados com o bálsamo de Deus.

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/46, n.º 4628, 13 de outubro de 2021

Editorial: Anunciar o que vimos e ouvimos

O cristianismo não se expande pelo proselitismo e/ou pela imposição, mas pela atração. É uma expressão conhecida do Papa Bento XVI e reiterada em diversas ocasiões pelo Papa Francisco, invocando também a atração maternal da Virgem Mãe. “Maria, a primeira discípula missionária, faça crescer em todos os batizados o desejo de ser sal e luz nas nossas terras (cf. Mt 5, 13-14)”.

Iniciámos o mês de outubro, reconhecido como um mês especialmente missionário. A abrir, a evocação da memória litúrgica de Santa Teresa de Menino Jesus. Embora não tenha saído do convento, para o qual entrou em tenra idade, foi proclamada pelo Papa Pio XII como Padroeira das Missões. Ela própria manifesta este propósito: “Não obstante a minha pequenez, quereria iluminar as almas como os Profetas, os Doutores, sentia a vocação de ser Apóstolo… Queria ser missionário, não apenas durante alguns anos mas queria tê-lo sido desde o princípio do mundo e continuar até à consumação dos séculos”.

Nesta ânsia, Teresa do Menino Jesus encontra a sua vocação: “Compreendi que a Igreja tem coração, um coração ardente de amor; compreendi que só o amor fazia atuar os membros da Igreja… compreendi que o amor encerra em si todas as vocações, que o amor é tudo e que abrange todos os tempos e lugares, numa palavra, que o amor é eterno… Encontrei finalmente a minha vocação. A minha vocação é o amor. Sim, encontrei o meu lugar na Igreja… no coração da Igreja, minha Mãe, eu serei o amor; com o amor serei tudo; e assim será realizado o meu sonho”.

O sonho de ser missionária realiza-se no amor!

Na mensagem para o Dia Mundial das Missões (a 24 de outubro, penúltimo Domingo de outubro), o Santo Padre recentra-nos no amor de Deus, acolhido, vivido e partilhado. “Quando experimentamos a força do amor de Deus, quando reconhecemos a Sua presença de Pai na nossa vida pessoal e comunitária, não podemos deixar de anunciar e partilhar o que vimos e ouvimos. A relação de Jesus com os seus discípulos, a sua humanidade que nos é revelada no mistério da Encarnação, no seu Evangelho e na sua Páscoa mostram-nos até que ponto Deus ama a nossa humanidade e assume as nossas alegrias e sofrimentos, os nossos anseios e angústias… O tema do Dia Mundial das Missões deste ano – «não podemos deixar de afirmar o que vimos e ouvimos» (Atos 4, 20) – é um convite dirigido a cada um de nós para cuidar e dar a conhecer aquilo que tem no coração. Esta missão é, e sempre foi, a identidade da Igreja: «ela existe para evangelizar» (São Paulo VI, Evangelii nuntiandi, 14). No isolamento pessoal ou fechando-se em pequenos grupos, a nossa vida de fé esmorece, perde profecia e capacidade de encanto e gratidão; por sua própria dinâmica, exige uma abertura crescente, capaz de alcançar e abraçar a todos… Apraz-me pensar que «mesmo os mais frágeis, limitados e feridos podem [ser missionários] à sua maneira, porque sempre devemos permitir que o bem seja comunicado, embora coexista com muitas fragilidades»”.

O Papa Francisco deixa claro que o anúncio se faz com a vida, na oração, com o coração, na ajuda concreta aos mais necessitados, procurando constituir e contruir fraternidade. Anunciar o Evangelho é chamar outros para a família. “Hoje, Jesus precisa de corações que sejam capazes de viver a vocação como uma verdadeira história de amor, que os faça sair para as periferias do mundo e tornar-se mensageiros e instrumentos de compaixão… Viver a missão é aventurar-se no cultivo dos mesmos sentimentos de Cristo Jesus e, com Ele, acreditar que a pessoa ao meu lado é também meu irmão, minha irmã”.

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/45, n.º 4627, 6 de outubro de 2021

Entrevista com Ricardo Pereira: Viver para contar a história

Chama-se #lamegoeuacredito e é um novo projeto de cidadania que a imensa maioria dos lamecenses já conhece e acarinha. Criado em junho de 2019, por Ricardo Pereira, regista para a posteridade as histórias de vida de “admiráveis” homens e mulheres que construíram ao longo das últimas décadas a identidade deste território. “Entre nós, há um conjunto assinalável de pessoas cujo talento e engenho permanece na sombra. Este projeto pretende justamente lançar um pouco de luz sobre elas, criando um registo escrito que ficará para memória futura, através da sua publicação em livro, e que por enquanto já dou a conhecer através das redes sociais e da imprensa local, nomeadamente na “Voz de Lamego”, afirma.

O projeto que Ricardo Pereira se dedica nas horas vagas, e sem qualquer apoio, visa promover e valorizar aquilo que Lamego tem de mais genuíno que são as suas gentes e a caminhada que cada entrevistado percorre até concretizar algo que o distinga dos demais. “Pode ser um artesão, uma doceira, um atleta ou um professor aniversário. Há sempre algo que torna cada uma destas pessoas verdadeiramente única e que acrescenta, à sua maneira, valor e talento a esta terra que possui um potencial enorme”, explica.

Até ao momento, e apesar da exposição pública que o projeto #lamegoeuacredito proporciona, todos os convidados abriram as portas da sua vida e do seu coração para partilharem com o público a sua história pessoal e profissional. “Na verdade, aquilo que desconhecemos é como se não existisse. Por isso, já parti à descoberta de dezenas e dezenas de lamecenses, na cidade e nas freguesias rurais, e nenhum recusou até ao momento o convite para falar comigo. Este facto deixa-me muito orgulhoso e reflete a seriedade com que este projeto é visto na nossa comunidade”, adianta.

Natural de Lamego, Ricardo Pereira, desempenha aos 43 anos de idade os cargos de assessor de imprensa em duas das mais prestigiadas instituições da região: o Município de Lamego e a Santa Casa da Misericórdia de Lamego. O contacto próximo com os centros de decisão locais e o apoio à organização de importantes eventos que marcaram indelevelmente a vida do concelho nos últimos anos contribuiu para o desenvolvimento da sua consciência cívica que veio a culminar com a criação de #lamegoeuacredito.

“No fundo, este projeto de cidadania é uma carta de amor escrita a Lamego. Tenho uma confiança profunda no talento e na generosidade dos lamecenses. Na capacidade desta pequena comunidade em superar os desafios do devir. Seleciono as pessoas para dialogarem comigo sobre a sua vida e o seu trabalho. Algumas escolhas podem parecer óbvias, outras surpreendentes, mas todos têm uma história que, na minha opinião, merece ser partilhada”, sublinha em entrevista ao jornal “Voz de Lamego”.

Ricardo Pereira ama a sua terra, até nas pequenas imperfeições que a tornam verdadeiramente única. Falar de amor-próprio também é isto: acarinhar e valorizar aquilo que de bom nasce e floresce à sua volta. As suas publicações nas redes sociais têm um alcance “enorme”, chegando muitas vezes a mais de 20 mil pessoas, segundo as estatísticas. “Toda esta aceitação e as abordagens muito positivas que me fazem na rua, deixam-me muito feliz. Já tive pessoas, vindas por exemplo de Viana do Castelo ou do Porto, antigos militares no CTOE, que regressaram a Lamego após muitos anos de ausência, arrebatados por algum escrito meu”, recorda.

As histórias que conta não são apenas as de quem já viveu muito. Ricardo Pereira também dá voz aos jovens empreendedores do concelho de Lamego: “Considero isto muito relevante: mostrar o caminho do futuro. Acredito que apenas a criação de riqueza que gera emprego e fixa a nossa população poderá garantir a revitalização social e económica da cidade de Lamego e do Interior do país”. Por esta razão, já promoveu o trabalho de muitos empresários ligados a diversas áreas de atividade, desde a agricultura à arte do restauro, do comércio tradicional aos novos agentes hoteleiros, mostrando uma cidade que se abre ao mundo e recebe os forasteiros de braços abertos.

E o que é que Lamego tem de especial?É a joia do Douro. Possui a capacidade de aglutinar um misto de talento, ideias e recursos culturais, absolutamente críticos para garantir o nosso crescimento e desenvolvimento. Os diálogos que mantenho mostram que a criatividade é o maior recurso endógeno desta comunidade. Além disso, somos o centro histórico da primeira região vinícola demarcada do mundo, berço do mais internacional e reconhecido produto português: o vinho do Porto. Lamego é um orgulho!”, enaltece em entrevista ao jornal “Voz de Lamego”.

Em simultâneo, Ricardo Pereira também já promoveu diversas ações de cidadania ativa. No início da pandemia da COVID-19, o projeto  #lamegoeuacredito doou e distribuiu aos lamecenses mais de 250 máscaras de proteção reutilizáveis, sobretudo a idosos e doentes crónicos. Entregou, por exemplo, equipamentos deste género à Delegação de Lamego da Liga Portuguesa Contra o Cancro e à Cruz Vermelha de Lamego que fizeram chegar as máscaras às pessoas mais necessitadas deste tipo de proteção. “Dinamizei esta ação solidária com o objetivo de proteger a saúde dos lamecenses mais vulneráveis num momento muito difícil para a vida da nossa comunidade. Quero deixar aqui uma palavra de reconhecimento pelo altruísmo e espírito solidário demonstrado pelas nossas voluntárias que dedicaram, durante o primeiro confinamento, o melhor do seu tempo para dar aos outros as ‘armas’ certas para enfrentar esta grave pandemia”, afirma.

Mais tarde, numa iniciativa de contornos distintos, propôs dar um pequeno contributo para apoiar, num momento crítico e de grande instabilidade, os empresários do setor da restauração. Assim, agregou num único local diversa informação sobre o serviço de takeaway e de entregas ao domicílio disponibilizado pelos restaurantes e tasquinhas locais. Aderiram voluntariamente dezoito empresas do setor. “Com a pandemia, a crise que paralisou o setor da restauração pôs em causa a sobrevivência de muitos postos de trabalho e foi sobretudo estes que quisemos ajudar. Conseguimos gerar mais procura, oferecendo às pessoas um roteiro simples sobre a oferta que existe na cidade de Lamego a este nível. O feed back que obtivemos foi muito positivo”, refere Ricardo Pereira.

Já durante a última época de verão, a iniciativa “Memórias de Lamego” nasceu de um desafio lançado pelo projeto de cidadania “#lamegoeuacredito”, junto de vários artistas locais ou que têm ateliê instalado no concelho para ajudar os idosos a reviver, através da arte, experiências guardadas na memória. Numa parceria inédita, cinco pintores ajudaram a resgatar a memória afetiva dos idosos do Lar de Arneirós. As suas pinturas, de diferentes estilos artísticos, ocupam agora um lugar de destaque na nova sala de estar da instituição, o local onde passam a maior parte do tempo. “O objetivo primordial foi criar algo parecido com um baú de memórias que liberte do esquecimento recordações antigas, aumentando, deste modo, o bem-estar destas pessoas em idade avançada. Julgo que este desígnio foi plenamente conseguido. Estamos agora abertos à doação de novas obras”, explica.

Questionado sobre a possibilidade de um dia enveredar por uma participação política ativa, Ricardo Pereira afirma que o “futuro a Deus pertence”, mas acrescenta que neste momento não faz parte dos seus planos. “Como cidadão livre, mantenho, obviamente, intactos os meus direitos cívicos. O meu legado é de um Homem apaixonado pela vida. Gosto do diálogo democrático e de debater com contraditório, mas a minha missão no imediato é continuar a valorizar Lamego e os Lamecenses”, sublinha.

in Voz de Lamego, ano 91/43, n.º 4625, 22 de setembro de 2021

Falecimento do Pai do Pe. Rui Borges

No último sábado, 2 de outubro, o Senhor do tempo e da eternidade, Deus da Vida e da Amizade, chamou a Si o Sr. Acácio Alves Pinto Ribeiro, pai do reverendo Pe. Rui Manuel Borges, pároco de Caria e do Carregal, na Zona Pastoral de Moimenta da Beira.

Em comunhão e em nome do presbitério da nossa diocese de Lamego, o Senhor Bispo, D. António Couto, endereça ao Pe. Rui, à família e aos amigos, as condolências, comungando da dor e da fé, desta esperança que nos abre a mente, o coração e a vida para Deus que é Pai e nos ama desde sempre e para sempre. Ele que nos chamou à vida, no Seu infinito amor, não nos abandona em nenhum momento da nossa existência, nem no final biológico/histórico. Com efeito, é este o mistério da nossa fé: a morte, em Jesus Cristo, dá lugar à vida plena e definitiva, com a ressurreição um vida nova e definitiva. Aquele que ressuscitou Jesus Cristo também nos ressuscitará a nós.

Celebrações Exequiais:

  • Domingo, 3 de outubro, pelas 15h00: Eucaristia na Igreja Paroquial de Caria;
  • segunda-feira, 4 de outubro, pelas 15h00: Eucaristia Exequial e funeral, na Igreja Paroquial da Penajóia, em Molães.

Rezemos pelo Sr. Acácio, que Deus acolhe no Seu coração de Pai, e pela família para que encontrem na fé e na Palavra de Deus, a esperança na vida eterna e na ressurreição dos mortos em Cristo Jesus.