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Entrevista com o Sr. Presidente da Câmara Municipal Cinfães, Enf.º Armando Silva Mourisco

Esta semana, o nosso jornal foi até Cinfães, prosseguindo a entrevistar os Presidentes de Câmara que servem os concelhos que formam a nossa Diocese. Damos a apalavra ao excelentíssimo Dr. Armando Silva Mourisco, naquele que é o segundo mandato à frente deste município.
Natural de Souselo, enfermeiro, 51 anos, casado e tem três filhos. Foi Presidente da Junta de Freguesia de Souselo, entre janeiro 2002 a outubro de 2009; Presidente da Assembleia de Freguesia de Souselo de outubro de 2009 a outubro de 2013; Deputado Municipal, entre 2002 e 2013; Presidente da Câmara desde 2013. Foi Vice-presidente da Comunidade Intermunicipal do Tâmega e Sousa, de setembro de 2015 a novembro de 2017, tornando-se então a Presidente da Comunidade Intermunicipal entre 2017 e final de 2019. Foi Vice-presidente da Dólmen. É Presidente do Conselho Consultivo do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa. Integra o conselho consultivo da Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Felgueiras/Politécnico do Porto. Membro do conselho geral da Associação Nacional de Municípios. Membro do Conselho Geral da Agência Portuguesa do Ambiente.
Voz de Lamego – A pandemia do novo coronavírus colocou-nos a todos em alerta. A resposta, como em tantas situações, passa pela intervenção local, em que o Presidente do Município tem um papel essencial, de coordenação e intervenção. Como tem vivido o concelho estes tempos? Principais necessidades e constrangimentos…
Tempos difíceis, estranhos e de enorme preocupação. São tempos também de muita articulação, parcerias, trabalho de equipa com a saúde, forças de segurança e socorro, instituições particulares de solidariedade social e segurança social, escolas, entre outras.
A preocupação dominante prende-se com os mais frágeis- idosos e doentes crónicos, considerando que a mortalidade é claramente elevada nesses grupos.
VL – O impacto económico foi certamente notado nas empresas e nas famílias. Que medidas foram implementadas pelo Município para acorrer às diferentes situações e para minimizar os prejuízos e as dificuldades sentidas?
Foram criados mecanismos de apoio ás famílias, instituições e empresas.
Nas famílias mais carenciadas e afetadas pela pandemia, assim como aos alunos das nossas escolas atribuímos vales de compras de produtos alimentares e de higiene, apoio nos transportes, na aquisição de medicação, no pagamento de serviços essenciais (água, luz). Também reforçamos o apoio ao arrendamento.
Realizamos a aquisição de 200 computadores que entregamos ás escolas que por sua vez os disponibilizaram aos alunos mais carenciados, tendo em vista o ensino á distância.
Reforçamos os apoios financeiros ás instituições particulares de solidariedade social e bombeiros, para além do fornecimento de equipamentos de proteção individual.
Às empresas mais afetadas pela pandemia, com o objetivo da preservação do emprego, isentamos o pagamento das taxas e impostos municipais, apoiamos no pagamento da renda, luz, água e layoff, atribuímos apoios a fundo perdido por cada posto de trabalho, promovemos a aquisição de produtos no comércio local, entre outras medidas.
VL – As IPSS´s de toda a região foram chamadas a prestar um apoio social decisivo à população, ao mesmo tempo que tiveram de cumprir apertadas medidas de segurança. Como foi a resposta das Instituições Sociais no Concelho? Que papel coube à Câmara?
As IPSS desenvolvem um dos papéis mais importantes na sociedade. Fazem-no com zelo, dedicação e sentido de responsabilidade.
O trabalho neste tempo de pandemia tem sido heroico. Esforço redobrado e disponibilidade absoluta dos recursos humanos, que muito louvamos e um aumento enorme da despesa.
Sobretudo a tarefa dificílima de proteger os utentes.
Infelizmente muitas, apesar de todo o trabalho, foram vitimas de surtos, lamentavelmente com perda de vidas humanas.
O município esteve sempre em parceria e apoio – na atribuição de ajudas financeiras e matérias de proteção para fazer face ás necessidades, na disponibilização de recursos humanos, na formação, na disponibilização de espaços de acolhimento, entre outros.
VL – O turismo, fundamental na nossa região, foi amplamente afetado, com um decréscimo acentuado no número de visitantes. A restauração, a hotelaria, pequenas empresas, produtos com a marca do Concelho, viram-se em grandes dificuldades. Foi adotada alguma medida especial para este setor e que expetativas tem para a atividade turística para o concelho em 2021?
A primavera e Verão 2020 foi de procura turística no concelho. Assim se espera novamente em 2021. Apesar de ser limitado a estes períodos temporais sempre ajuda na manutenção da atividade.
Relativo aos apoios disponibilizados pelo município, para além da promoção turística e territorial, isentamos o pagamento das taxas e impostos municipais, apoiamos no pagamento da renda, luz, água e layoff, e promovemos descontos de 25% no alojamento, nos estabelecimentos aderentes, de forma a atrair mais visitantes.

VL – Nesse sentido, ainda, como é que foi a coordenação das medidas a implementar entre o poder local, bem no interior do país, e os organismos centrais? E já agora, desempenhando as funções de Presidente da CIM Tâmega e Sousa, em que medida esta tem contribuído para uma resposta conjunta mais coordenada e eficiente?
Penso que desde a criação do ministério da coesão territorial, e da aplicação de um conjunto de medidas de apoio especificas para o interior, que a articulação e o olhar para esse interior mudou significativamente.
Quanto às CIM tem sido fundamental na articulação de polticas supramunicipais e de uma visão integrada das respostas.
VL – A dinâmica dos municípios foi igualmente decisiva neste contexto. Mas, apesar dos constrangimentos, os projetos em curso continuaram. O que gostaria de ver concretizado até ao final deste mandato autárquico?
Em Cinfães existem um conjunto de investimentos em curso, quer na área da reabilitação urbana, no turismo, nas acessibilidades, na dinâmica empresarial fundamentais para o desenvolvimento económico e social e para a empregabilidade do concelho.
Esperamos que até final do mandato esses investimentos decorram sem alterações.
VL – Para alguém que visita o concelho, como o apresentaria? Que caraterísticas distintivas tem este território, do ponto de vista económico e empresarial, cultural e patrimonial?
Cinfães propõe uma comunhão total com a natureza. A paz e o sossego de uma região no seu estado de conservação mais puro, a tranquilidade e segurança a dois passos de grandes centros urbanos estão ao alcance de todos.
Cinfães é um destino naturalmente único. Entre o cimo da serra de Montemuro e a foz do Rio Paiva no Rio Douro, da montanha ao verde das margens dos rios, Cinfães está perto de tudo e longe do reboliço e stress do dia-a-dia.
Acresce a isto uma gastronomia fantástica, a cultura e tradições, o edificado românico existente e os sentimentos acolhedores das nossas gentes.
VL – A população concelhia, a exemplo do que acontece em todo o interior português, envelhece e diminui. Que consequências se avizinham? Como contrariar o êxodo da população a que assistimos e favorecer a sua fixação entre nós? Como vê, a partir do lugar que ocupa, a situação do País? Tendo em conta também os tempos que se avizinham…
É verdade que todo o país e toda a europa envelhece.
São os novos hábitos de viver, as dificuldades de estabelecer empregos permanentes e duradouros, que acontece cada vez mais tarde e que levam á formação da família também mais tarde.
O interior envelhece mais rápido, fica mais despovoado. Os jovens emigram, fruto dos salários mais atrativos no exterior.
Incentivos á natalidade, salários mais atrativos, políticas de incentivo fiscais ao povoamento dos territórios do interior, promoção do interior como territórios com atrativos de qualidade de vida são urgentes adotar. Assim como mudar estilos e mentalidades e que deve começar no ensino pré-primário.
VL – A menos de um ano do fim do atual mandato autárquico, que balanço faz do trabalho realizado?
Não é fácil ser juiz em causa própria, mas da minha parte avalio como muito positivo, de aumento da qualidade de vida do concelho, da imagem positiva e atrativa para o exterior. No entanto terão de ser os cinfanenses a avaliar a atuação da câmara.
VL – Que mensagem de esperança e de estímulo gostaria de transmitir aos seus munícipes para este novo ano?
De muita paciência, resistência e resiliência. Sabemos que os tempos se mantêm difíceis, mas temos de nos manter fortes e muito responsáveis. Só assim ultrapassaremos as dificuldades e estes tempos estranhos, de saudade e tantas vezes de sofrimento e dor.
Mas também uma mensagem de esperança e confiança num futuro melhor, porque ele existe!
in Voz de Lamego, ano 91/20, n.º 4602, 30 de março de 2021
Editorial da Voz de Lamego: Como Maria, com o olhar fixo em Jesus

A alegria do Evangelho, a Boa Notícia, proclamada no primeiro dia da Semana, o Domingo de Páscoa, é que Cristo, Filho de Deus vivo, está no meio de nós. As trevas foram vencidas pela luz. O medo deu lugar à confiança. Da morte ressurgiu a vida. O Crucificado ressuscitou. O amor venceu o pecado e a desolação.
Estamos em plena Semana Santa. A liturgia destes dias faz-nos peregrinos do Calvário e da Cruz, do amor e da entrega de Jesus, da vida nova que vai surgir.
Antes da Páscoa, a sexta-feira santa. A sexta-feira só se percebe com a Luz que irradia do túmulo de Jesus. A Ressurreição surge depois da Cruz e faz-nos perceber que chegamos à vida quando a gastamos a favor dos outros.
Olhando para os discípulos, para Judas e para Pedro, para as mulheres, para Simão de Cirene, para Pilatos e autoridades judaicas, para uma multidão instigada pelos líderes religiosos, como é que nos vemos diante de Jesus? Se tivéssemos estado lá, naquela ocasião, poderíamos ser qualquer um. Fortalecidos pelo testemunho de muitos, pelo encontro com o Ressuscitado, pelo acolhimento de Jesus, vivo, nas comunidades que se fazem Igreja, Corpo de Cristo, por certo estamos mais preparados para Lhe responder.
Ao longo da história da Igreja, muitos foram testados na sua fé. A esta distância, seria fácil julgar aqueles que não tiveram a força suficiente para resistir às ameaças, à perseguição, à exclusão, à tortura. Perante tamanha violência, teremos que reconhecer que não sabemos se resistiríamos ou não. Mas muitos foram capazes de seguir Jesus até à Cruz, até à morte. Na atualidade, continua a haver muitos mártires, pessoas excluídas do emprego, da habitação, expulsas do seu país, a serem torturadas e mortas, mas ainda assim, a persistirem na fé cristã.
Jesus, no Horto das Oliveiras ou no Calvário, diante da violência que se aproxima e a que Se sujeita, confia no Pai. Faça-se o que Tu queres.
Com Maria aprendemos a responder ao projeto de Deus, acolhendo a Sua vida, deixando que Ele nos preencha com a Sua Graça. Mais visível ou mais discretamente, Maria está por perto de Jesus, gerando-O e dando-O ao mundo, nos primeiros passos, ensinando-O a falar e a andar, e a rezar, e, juntamente com São José, mostrando como é importante viver em família, respeitar as pessoas idosas, ajudar os vizinhos, participar dos momentos de festa e dos momentos de dor. Em Jerusalém, Maria e José colocam o Menino sob a proteção de Deus. Mais tarde, Maria participa na alegria das Bodas de Caná e intervém junto de Jesus. Durante a Sua vida pública, os evangelhos mostram-na preocupada com o que d’Ele se diz. Em tantas situações, percebe-se que Maria está com os discípulos e com outras mulheres. Também no caminho agreste, duro, pesado do Calvário, junto à cruz, de olhar firme e coração apertado, Ela permanece diante de Jesus, Filho de Deus, e Seu Filho muito amado. É Mãe que chora, por todas as mães que perdem os seus filhos, e, como discípula, acolhe a vontade de Deus. E qual a vontade de Deus? Que sejamos felizes, sabendo que a felicidade passa pelo amor, pela entrega confiante, pelo serviço aos irmãos, ainda que exija esforço, dedicação e sacrifícios. Quem se sujeita a amar, sujeita-se a padecer.
Fixemos o nosso olhar no de Jesus, permitindo que Ele nos guie da Cruz à eternidade, da morte à ressurreição, da sexta-feira da Paixão ao Domingo de Páscoa, das trevas à luz, da tristeza à alegria do reencontro, do desencanto à paz que Ele nos dá.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/20, n.º 4602, 30 de março de 2021
Monjas Dominicanas de Clausura: 50 Anos de Presença em Benguela

No dia 29 de março, comemorámos a abertura do Jubileu dos 50 anos da chegada das Monjas Dominicanas de Clausura a Benguela- Angola.
Foram 10 irmãs espanholas enviadas pela Serva de Deus, Madre Teresa Maria de Jesus Ortega OP do Mosteiro Madre de Dios” em Olmedo -Valladolid-Espanha, a pedido do primeiro bispo de Benguela, de feliz memória, D. Armando Amaral dos Santos
Partiram de Olmedo no dia 5 de março de 1972 para embarcar no “Príncipe Perfeito” desde Lisboa, rumo a Angola, e no dia de São José a 19 de março, pisaram o solo Benguelense no dia 29 do mesmo mês. Estas dez jovens Monjas cheias de ardor missionário, com desejo de doar as suas vidas nas terras angolanas, imediatamente começaram a dar frutos abundantes. No mesmo ano da sua chegada a Angola, depois de 4 meses, enviaram a primeira angolana a Espanha e, nos dois anos seguintes, outras cinco aspirantes. Muitas destas Irmãs já estão espalhadas por vários países, das quais também vieram 6 irmãs para reforçar a Comunidade das Monjas Dominicanas de Lamego do Mosteiro de Nossa Senhora da Eucaristia, de acordo com as duas Federações.
Desde este cantinho do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios, onde se encontra o Mosteiro, damos graças a Deus que nunca abandona aqueles que a Ele se querem consagrar e dar-Lhe glória. É com júbilo que recordamos este dia, pois nascemos daquele “tronco do Mosteiro da Mãe de Deus de Benguela”, e aqui estamos para fazermos uma nova história, unidas às nossas três irmãs que aqui já se encontravam e que nos acolheram com muita alegria, em união com o povo de Deus de Lamego, apoiadas sempre pelo nosso Bispo, D. António Couto, os Rvdos. Padres Pe. José Abrunhosa e Pe. João Carlos e, igualmente, outros sacerdotes a quem queremos agradecer todo o apoio espiritual. Unidos nesta ação de graças, pedimos a vossa oração pela nossa perseverança ao serviço de Deus e da Diocese.
Irmã Maria da Glória O.P.
D. António Francisco: “consagrou o coração ao serviço dos outros”
O Município de Lamego prestou na manhã desta sexta-feira, 19 de março, uma sentida homenagem a D. António Francisco dos Santos, cidadão Honorário do Município de Lamego, falecido em 2017, cuja vida e empenho pastoral marcou indelevelmente a vida desta cidade e das suas gentes.
A cerimónia decorreu, primeiro, na rotunda do Centro Escolar n.º 1, local onde foi construído um memorial evocativo da sua passagem por Lamego com a inscrição “Os pobres não podem esperar”, proferida aquando da sua apresentação como Bispo do Porto, sendo marca indelével do seu percurso de vida. Neste local, deverá ser erguida uma escultura em tributo a D. António, de Francisco Laranjo, reputado artista plástico lamecense. “Da terra, erguer-se-á uma aliança que simboliza alguém que nos marcou muito”, explica o autor.
Logo a seguir, realizou-se uma sessão simbólica com a intervenção do Presidente da Câmara Municipal de Lamego e de diversas personalidades relevantes da vida política e religiosa portuguesa, em representação de instituições e locais, que se cruzaram, em algum momento, na vida de D. António Francisco e que quiseram, deste modo, associar-se ao tributo público do Município de Lamego. Todos os testemunhos foram unânimes em recordar e enaltecer a sabedoria, a simplicidade e a generosidade de um “padre e de um Bispo com um grande coração”. “Será com este espírito de D. António que, nestes tempos de dor e sacrifício para todos, em maior ou menor grau, mas também já de esperança, que nos devemos congregar na reconstrução de um futuro promissor, sempre com a maior incidência nos mais carenciados e desfavorecidos, em prol do nosso bem-estar coletivo”, afirmou Ângelo Moura.
Presente nesta sessão pública de homenagem, D. Américo Aguiar, Bispo Auxiliar de Lisboa e vigário geral da Diocese do Porto à data do falecimento de D. António Francisco, sublinhou que o homenageado foi sempre “um Homem de raízes que consagrou todo o seu coração ao serviço dos outros”. “Foi um Homem do Amor de Deus e, por causa disso, amava os pobres”, elogiou D. António Couto, Bispo de Lamego.
Nascido em 1948 em Tendais, concelho de Cinfães, o pontífice frequentou os seminários de Resende e de Lamego (onde concluiu o Curso Superior de Teologia), tendo sido ordenado padre em 1972. Tornou-se bispo em 2005, na Sé de Lamego, tendo sido distinguido, nesse mesmo ano, com a Medalha de Ouro desta Cidade, a mais alta distinção concedida pelo Município. D. António Francisco dos Santos sucedeu a D. Manuel Clemente na liderança da diocese do Porto, em fevereiro de 2014, tendo anteriormente passado pela arquidiocese de Braga, como bispo auxiliar, e pela diocese de Aveiro, como bispo titular.
Ricardo Pereira, in Voz de Lamego, ano 91/19, n.º 4601, 23 de março de 2021
Delfina Adrega – A senhora biscoiteira do Bairro da Ponte

O primeiro instinto para melhor receber quem chega é remexer num pequeno saco plástico e estender depois a mão: “Tome lá uma cavaquinha!”. É assim, desde há mais de 40 anos, quando Maria Delfina Adrega se aventurou, sozinha, na cozinha lá de casa a confecionar o famoso Biscoito da Teixeira, que se transformou depois no conhecido cartão-de-visita da pequena banca que tem por hábito instalar, nos dias quentes, na “sala de visitas” da cidade de Lamego, a Av. Dr. Alfredo de Sousa. “Eu andava a cozer para as outras e a acartar para esta e para aquela, mas depois abri os olhos e também aprendi”, recorda. Natural da freguesia de Magueija, cedo desceu à cidade para viver no animado Bairro da Ponte, banhado pelo rio Balsemão, outrora alfobre de uma comunidade próspera, onde não faltavam moleiros, sapateiros, comerciantes e, claro, algumas biscoiteiras. Ainda hoje é aqui que se sente mais à vontade e continua a morar, embora lamente que “muita coisa” esteja a cair.
Maria Delfina começou tarde nas lides da doçaria. Apenas por volta dos 35 anos de idade. Nessa época, recorda, vendia menos. “Só fazia um bocadinho. Meia arroba ou uma arroba. Agora faz-se mais”. Para além de Lamego, chegou a vender noutras paragens em festas e romarias. “Adorava isso”. Era assim que garantia o sustento lá de casa. Teve seis filhos, enviuvou cedo, e precisou então de todo o ânimo e destreza para conciliar todas estas tarefas. “Sempre tive força para fazer tudo”. Agora, o peso da idade já não lhe permite amassar e cozer o biscoito no forno a lenha como antes. Foi uma filha que herdou a responsabilidade de dar forma ao Biscoito da Teixeira, fiel à receita de sempre: farinha, açúcar, sal e “muito limãozinho”.
Atrás da sua pequena banca, sob uma toalha imaculada, Maria Delfina ajeita cuidadosamente o sortido de produtos que adoça a boca de muitos lamecenses e turistas. Para além do Biscoito, também há cavacas do Porto, bolos podres, pães-de-ló e até rebuçados da Régua. Tudo fresco e doce, como convém, e que transformam este local todas as semanas num destino de peregrinação para os clientes fiéis. Problemas de saúde, decorrentes da diabetes, já não a deixam ver com a nitidez de antigamente. Pede, por isso, muitas vezes a quem chega que a ajudem a escolher as pequenas moedas para devolver o troco certo.
“Gostei sempre de estar aqui. Estou habituada. Se me tiram isto, então é que vou mais depressa embora”, explica. Para muitos turistas que calcorreiam pela primeira vez as imensas avenidas centrais de Lamego, em direção ao Santuário dos Remédios, é a D. Delfina quem lhes dá as boas-vindas. “Prove lá uma cavaquinha. Eu dou”, interpelando sempre quem passa.
Ricardo Pereira, in Voz de Lamego, ano 91/19, n.º 4601, 23 de março de 2021
A relevância dos meios jornalísticos locais para os cidadãos
Do nosso colaborador, Fábio Ribeiro, professor e investigador na área das Comunicações Sociais:
“Estou neste momento a desenvolver um estudo sobre a forma como os cidadãos se relacionam com os meios de comunicação jornalísticos de âmbito local e regional. Será para publicar numa revista científica internacional, que estou a editar com um colega da Universidade Nova de Lisboa.
Seria possível colocar o inquérito deste estudo no site ou nas redes sociais ligadas à Voz de Lamego? Seria muito útil para obter o maior número de respostas possível. Como é lógico, os dados das respostas são anónimos e confidenciais e servem apenas para efeitos de tratamento estatístico e matemático.
O link do inquérito é este: http://www.lasics.uminho.pt/limesurvey/index.php/591135
O título do inquérito é: “A relevância dos meios jornalísticos locais para os cidadãos”.
Muito obrigado pela atenção.
Conferência online com D. António Couto, bispo de Lamego
A PAULUS Editora organiza, na próxima quinta-feira, dia 25 de março, uma conferência com D. António Couto, bispo de Lamego, sobre a sua mais recente obra, «Do lado de cá da meia-noite», editado pela mesma editora.
A obra consta de seis ensaios, originais, que D. António Couto escreveu no contexto de pandemia, «ensaios que julgo significativos para ajudar a viver com esperança, e com esperança superar a crise pandémica que atravessamos», começa por escrever o prelado no início do livro, em jeito de enquadramento da obra.
Para o diretor editorial da PAULUS, estes encontros online são uma forma de «dar a conhecer a mais gente os conteúdos das nossas obras», oportunidade que este responsável diz ser «única», já que, com os constrangimentos em vigor devido à pandemia, a realização destas apresentações de forma presencial não é ainda possível.
A conversa virtual, que decorre a partir das 21h, no dia 25 de março, na página de Facebook da PAULUS Editora, vai ter ainda a presença do diretor editorial da PAULUS, Ir. Tiago Melo, e do jornalista da revista Família Cristã, Ricardo Perna.
Editorial Voz de Lamego: Estamos agora mais perto da salvação!

É a nossa esperança assente na fé que nos une a Jesus Cristo e, n’Ele, aos irmãos, constituídos em comunidade, em discípulos missionários. A Páscoa é oportunidade para amadurecermos e renovarmos a nossa fé, purificando-a do acessório, tradições, usos e costumes. Estes são beneméritos na medida em que nos ajudem a reaviar os acontecimentos do passado, tornando-os visualizáveis na atualidade.
O acontecimento da paixão redentora de Jesus, não é uma realidade do passado, é vivência real do nosso tempo. Jesus dá-Se, de novo, por ação do Espírito Santo, em Igreja. Ele veio! Ele vem e traz a eternidade até nós, faz-nos participar do banquete celeste. Na Cruz, Ele oferece-Se por mim e por ti, faz-nos irmãos, envolve-nos em família. Ressuscita e arrasta-nos para a vida divina; partilha a Sua vida, torna-Se um de nós, para nos fazer participantes da Sua vida. É o mistério maior da nossa fé. Estamos lá! Ele está ali, na Eucaristia, senta-Se connosco, fala para nós, interpela-nos, dá-nos o Seu corpo, a Sua vida por inteiro.
De forma mais solene, em cada ano, a Páscoa é um desafio que nos faz recuar no tempo, ao tempo da vida histórica de Jesus, mas sempre na certeza que não somos tanto nós que recuamos, mas é Ele que traz o passado até à nossa vida, fazendo-nos experimentar, no encontro d’Ele connosco, a Sua entrega filial. A hora é hoje. É hoje que Jesus está na Cruz, é hoje que Jesus sofre em cada irmão marginalizado, esquecido, violentando, em cada irmão espezinhado ou remetido para as periferias. Jesus continua a ser crucificado na criança que morre à fome, na mulher que é agredida, nas famílias destruídas pela guerra, ou em busca de pão, no jovem iludido nas dependências químicas, nos pobres sacrificados à economia.
É hoje que Jesus ressuscita e nos ressuscita nos propósitos e compromissos de O acolhermos, acolhendo, amando e servindo os irmãos. Aquilo que fizerdes ao mais pequenos dos irmãos é a Mim que o fazeis. Não há verdadeira Páscoa sem conversão ao coração de Cristo, que ama, consumindo-Se totalmente. Não há verdadeira Páscoa, transformação autêntica, se continuar a faltar tempo e lugar para os mais pequeninos, para os mais pobres e fragilizados. A Páscoa recria a criação, torna novas todas as coisas. Somos o Seu olhar, as Suas mãos que perdoam e abençoam, protegem e levantam, servem e ajudam.
Interpela-nos São Paulo: “Sabeis em que tempo vivemos: já é hora de acordardes do sono, pois a salvação está agora mais perto de nós do que quando começamos a acreditar. A noite adiantou-se e o dia está próximo. Despojemo-nos das trevas e revistamo-nos das armas da luz” (Rom 13, 11-12).
Há um ano vivemos uma Quaresma atípica! Como atípica também a deste ano. Há um ano, as celebrações comunitárias foram confinadas! Desta vez, a Quaresma iniciou em confinamento, mas em tempo útil regressámos à comunidade, ali onde a Igreja nasce, amadurece e se realiza. Claro que em cada Eucaristia está todo o povo, pois Deus, em Jesus, pelo Espírito Santo, dá-Se para todos, não para uma pessoa, por mais santa que pudesse ser. A oferenda é por todos, todos estão implicados na oração e no banquete, todos são benificiários do mistério pascal. Mas, na realidade sensível da nossa carne, sentimos urgência e necessidade de estarmos também fisicamente envolvidos, próximos dos outros ao ponto de lhes vermos os olhos e sentirmos o seu odor e os seus tremores!
Deixemo-nos envolver pela alegria da Páscoa que se aproxima, certos de estarmos mais perto… da salvação.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/19, n.º 4601, 23 de março de 2021
Editorial VL: São José, custódio de Maria, de Jesus e da Igreja

Há oito anos, o Papa Francisco escolhia o Dia de São José para iniciar o seu pontificado. Curiosamente, como o próprio sublinhou, onomástico de Bento XVI, cujo nome de batismo é José (Joseph).
Francisco quis colocar o seu pontificado sobre o cuidado de São José. Se José, com humildade e descrição, mas com firmeza, cuidou de Maria e de Jesus, também cuidará da Igreja.
Ao longo da história da Igreja, São José, embora acarinhado por ser o pai adotivo de Jesus, surgia quase como um figurante num filme, integrava o elenco mas sem se dar por ele. Justiça seja feita, nos últimos anos este quadro tem-se alterado.
Há 150 anos, o Beato Pio IX, com o Decreto Quemadmodum Deus, declarou São José como Padroeiro Universal da Igreja. Face à grande hostilidade, o Papa confiava a Igreja ao patrocínio de São José. Em 8 de dezembro último, o Papa Francisco, com a Carta Apostólica Patris Corde, convocou um ano especial dedicado a São José e que se prolonga até à próxima solenidade da Imaculada Conceição.
Diz-nos São João Paulo II: «São José, assim como cuidou com amor de Maria e se dedicou com empenho jubiloso à educação de Jesus Cristo, assim também guarda e protege o seu Corpo místico, a Igreja, da qual a Virgem Santíssima é figura e modelo» (Citado por Francisco, nesta homilia inaugural de pontificado).
O Evangelho é Jesus, a Sua vida e mensagem, a Sua morte e ressurreição. O quadro principal é o mistério pascal, as últimas horas da Sua vida terrena de Jesus, desembocando na Cruz, como oferenda total, e finalizando com a ressurreição, vida nova, à qual nos agrega, enviando-nos a anunciar esta alegre notícia ao mundo inteiro. Os demais livros do Novo Testamento mostram como Jesus está vivo e age pelos Seus discípulos em diversos contextos. Recuar à infância de Jesus não fez parte das cogitações dos evangelistas, ainda que São Lucas e São Mateus nos apresentem um ou outro episódio, sabendo que a preocupação não era escrever uma biografia, mas fixar por escrito o que, primeiramente, foi proclamado oralmente em pequenos grupos de pessoas. Pouco a pouco, a formação das comunidades e a necessidade de o testemunho oral não se esbater com a morte dos apóstolos.
O vislumbre sobre São José já nos diz muito. Discreto, é um homem justo, piedoso, trabalhador, disponível para escutar a Palavra de Deus e realizar os Seus sonhos para a humanidade. Comprometido com Maria, apercebendo-se que se achava grávida, sem a sua intervenção, pondera, mesmo aí, proteger Maria, fazendo recair sobre si o ónus do “abandono” familiar, salvaguardando-A de qualquer suspeita. Porém, Deus baralha-se os propósitos e desafia a envolver-Se no Seu mistério de amor.
O Papa Francisco apresenta-nos São José como custódio, com protetor de Nossa Senhor e do Menino Jesus. Como é que São José realiza esta guarda? “Com discrição, com humildade, no silêncio, mas com uma presença constante e uma fidelidade total, mesmo quando não consegue entende… Permanece ao lado de Maria, sua esposa, tanto nos momentos serenos como nos momentos difíceis da vida… é «guardião», porque sabe ouvir a Deus, deixa-se guiar pela sua vontade e, por isso mesmo, se mostra ainda mais sensível com as pessoas que lhe estão confiadas, sabe ler com realismo os acontecimentos, está atento àquilo que o rodeia, e toma as decisões mais sensatas. Nele, queridos amigos, vemos como se responde à vocação de Deus: com disponibilidade e prontidão”.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/18, n.º 4600, 16 de março de 2021
Editorial da Voz de Lamego: Ao encontro de Abraão, da bênção e da paz

Por estes dias, de 5 a 8 de março, o Papa Francisco saiu, novamente, do Vaticano e deslocou-se ao Iraque, numa Viagem histórica, desejada por João Paulo II, mas só possível no pontificado atual. Tendo em conta o contexto sempre inseguro do Médio Oriente, tornou-se uma viagem com cuidados redobrados, acrescendo a isso o facto de estarmos a atravessar uma pandemia. Prevaleceu a vontade do Santo Padre e de todos quantos se empenharam nesta missão. Onde o Papa vai, vai com ele Jesus e o Evangelho, e uma mensagem de paz, de fraternidade e de bênção.
Um dos locais emblemáticos é a cidade de Ur, na Caldeia, atual Iraque, onde Abraão nasceu e viveu e de onde partiu para Canaã, respondendo ao chamamento de Deus. A figura de Abraão é incontornável para as três religiões (abraâmicas) monoteístas: judaísmo, cristianismo e islamismo. Abraão é considerado o Pai da fé, por ter sido o primeiro, segundo a Bíblia, a acreditar num Deus único e pessoal. É uma herança comum. Há muitas mensagens e práticas que diferenciam os crentes das três grandes religiões, mas também há muitos pontos de contacto: a fé num Deus único, criador do Universo; o Patriarca Abraão, como pai na fé.
Abraão mostra que a prioridade da sua vida é Deus. Responde à Sua voz. Deixa a casa paterna, a pátria, sem saber para onde o Deus o guia, mas parte em total obediência e confiando totalmente no Senhor. Quando Deus lhe pede, como holocausto, o sacrifício do seu filho Isaac, Abraão, embora triste, porque era o filho da sua velhice, e que deveria perpetuar o nome e a descendência, não hesita, oferece-o a Deus. Se foi Deus quem lho concedeu, é a Deus que pertence.
Com Abraão, aprendemos que diante de Deus somos iguais. Não temos certificado de posse nem dos filhos, nem dos pais, nem do marido ou da esposa. Somos iguais. Somos filhos d’Ele, logo irmãos uns dos outros. Não temos direitos sobre os outros. Só Deus é Deus, só a Ele Lhe pertencemos realmente. E, porque Lhe pertencemos, não podemos ser escravizados nem instrumentalizados pelos outros e, da nossa parte, não podemos espezinhar ou desprezar os irmãos, porque o que fizermos ao mais pequeno dos irmãos é a Ele que o fazemos.
Nem sequer a terra é nossa. Deus chama Abraão, promete-lhe uma descendência e uma terra. Mas tal como a descendência, também a terra que lhe é confiada não tem um certificado de posse, mas para cuidar e para que também a terra seja refúgio e sustento da sua descendência e de todos os povos. «Abençoar-te-ei e multiplicarei a tua descendência como as estrelas do céu e como a areia das praias do mar… na tua descendência serão abençoadas todas as nações da terra». A voz de Deus faz-se ouvir: «Não levantes a mão contra o menino, não lhe faças mal algum». Não matarás. Não levantarás a mão contra o teu irmão. Foi o pecado de Caim, o ciúme e a inveja, que levaram ao fratricídio, que destrói a fraternidade. A mensagem que o Papa levou ao Iraque, com ênfase a partir de Ur, é o da fraternidade. Somos irmãos. Somos filhos de Abraão na fé. Professamos a fé no mesmo Deus único e criador. A religião não pode ser fratricida. “Da terra do nosso pai Abraão, afirmamos que Deus é misericordioso e que a ofensa mais blasfema é profanar o seu nome odiando o irmão. Hostilidade, extremismo e violência não nascem dum ânimo religioso: são traições da religião. O Céu não se cansou da terra: Deus ama cada povo, cada uma das suas filhas e cada um dos seus filhos! Nunca nos cansemos de olhar para o céu, de olhar para estas estrelas… O sonho de Deus: que a família humana se torne hospitaleira e acolhedora para com todos os seus filhos; que, olhando o mesmo céu, caminhe em paz sobre a mesma terra”.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 91/17, n.º 4599, 9 de março de 2021