Editorial da Voz de Lamego: À procura da unidade plural
Todos os anos, entre o dia 18 e 25 de janeiro, se celebra o Oitavário de Oração pela Unidade dos Cristãos, concluindo-se com a festa da conversão de São Paulo, apóstolo que zelou pela unidade da Igreja, pela unidade dentro das comunidades, procurando também a sintonia com os Doze (apóstolos).
Jesus, na oração sacerdotal, verdadeiro testamento espiritual, deixa claro a razão da encarnação e da entrega que se aproxima: “…para que todos sejam um só, como Tu, Pai, estás em mim e Eu em ti… Eu dei-lhes a glória que Tu me deste, de modo que sejam um, como Nós somos Um. Eu neles e Tu em mim, para que eles cheguem à perfeição da unidade e assim o mundo reconheça que Tu me enviaste e que os amaste a eles como a mim” (Jo 17, 21-23).
A Igreja é santa, porque o Seu fundador é santo, mas simultaneamente pecadora, porque é constituída por homens. As divisões fizeram-se sentir ainda em vida de Jesus, quando alguns discípulos seguiram outro caminho ou quando Judas abandonou o barco. Com a evangelização, procuram-se pontos de contacto mas surgem também ruturas, discussões e de divisões. Paulo recorda-nos que todos de Cristo, fomos batizados no mesmo Espírito, professamos a mesma fé, recebemos, vivemos e anunciamos o mesmo Evangelho. Não existem cristãos de Paulo, de Apolo ou de Pedro, os cristãos são de Cristo, ponto de convergência! O caminho terá de ser, sempre, de fidelidade a Jesus.
Os cristãos passaram séculos a dividir-se até perceberem a traição ao mandato de Cristo. A transformação do mundo começa por cada um de nós, em nossa casa, na nossa família, na nossa comunidade, na Igreja. Os despiques e a fragmentação de grupos e de igrejas em nada contribuíram para a paz e para uma sociedade mais fraterna.
Seguindo Jesus, teremos de agir como Ele, procurando o que nos irmana, reconhecendo que somos todos filhos de Deus. Um dos pontos de contacto e de sintonia é a oração. Rezamos ao mesmo Deus, que é Pai e Filho e Espírito Santo. Por sua vez, a oração leva-nos à opção preferencial pelos mais pobres. Por outras palavras, a oração leva-nos a agir como Aquele a Quem rezamos.
Este ano, o subsídio de apoio para esta semana foi elaborado pelas Igrejas de Malta e Gozo, partindo do versículo dos Atos dos Apóstolos “Trataram-nos com gentileza” (28,2). “No dia 10 de fevereiro, em Malta, muitos cristãos celebram a Festa do Naufrágio do Apóstolo Paulo, a comemorar e a agradecer pela chegada da fé cristã àquela ilha. O trecho dos Atos dos Apóstolos proclamado para a ocasião da festa é o mesmo escolhido como tema da Semana de Oração deste ano”. O contexto destas Igrejas das ilhas permite um sublinhado importante, a atualidade do naufrágio e dos refugiados. “Hoje muitas pessoas enfrentam os mesmos perigos no mesmo mar. Os mesmos lugares citados nas Escrituras caracterizam as histórias dos migrantes de hoje. Em várias partes do mundo, muitas pessoas enfrentam viagens perigosas, por terra e pelo mar, para fugir de desastres naturais, guerras e pobreza. Também para eles, são vidas à mercê de forças imensas e altamente indiferentes, não só naturais, mas também políticas, económicas e humanas”.
Para cada um dos dias, uma temática a rezar e a refletir, e que nos diz do caminho que temos de percorrer: reconciliação, luz, esperança, confiança, força, hospitalidade, conversão e generosidade.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 90/08, n.º 4543, 21 de janeiro de 2020