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Archive for Dezembro, 2019

Editorial da Voz de Lamego: Deixai que o Menino chore

Como o Menino Jesus estava a chorar, São José terá dito a Nossa Senhora que era melhor dar-lhe uns açoites no rabo para que se calasse. A resposta de Maria é que deixem que o Menino chore porque Ele irá ter a sua conta de açoites, preanunciando as punhadas e as chicotadas que haveria levar em adulto, principalmente na aproximação ao Calvário. Une-se, nesta música antiga, originária dos monges de Coimbra, o Natal, a infância de Jesus, e a Paixão, os momentos de agressão para com Jesus. É este o contexto de uma música trabalhada e interpretada pelo “Bando Surunyo”, no concerto de Natal, na Igreja Matriz de Tabuaço.

Por ocasião do seu aniversário natalício, o Papa Francisco referiu-se a um presépio diferente: “Deixemos a mãe descansar”. Na representação, que rapidamente se tornou viral, Maria dorme enquanto José segura o Menino Jesus. Desta forma, o Santo Padre falava numa realidade concreta da família de Nazaré, mas também de muitas famílias, onde a ternura, a atenção e o cuidado predominam, onde o marido e a mulher se entreajudam nas lides domésticas. O nascimento de um filho, e os primeiros dias, e meses, altera por completo a vida em casa, multiplicando tarefas, acentuando o cansaço.

Deixar que o menino chore… nem sempre é fácil dizer não ao menino, contrariá-lo, deixar que chore, que faça birra, que caia e se suje, que brinque e tenha momentos em que não faz nada. Há, atualmente, uma necessidade imensa de preencher por completo a vida das crianças, não lhes dando tempo para pensar, para a espera paciente e também para momentos de rotina. Quer, dá-se-lhe; faz birra, cede-se-lhe; tem alguns momentos sem nada para fazer, passa-se-lhe o telemóvel para se ocupar. A agenda das crianças é tão preenchida que, por vezes, nem têm tempo para brincar: é preciso estudar, ir à natação, à música, ao Ballet, à dança, ao futebol. Uma correria constante. Há crianças começam a começar o stress!

No contexto que nos diz respeito mais diretamente, a catequese e a participação na Eucaristia, as crianças e adolescentes vão, e com gosto, se não houver um torneiro, uma competição, ou se as explicações forem noutro horário. Não estou a sugerir que a educação seja fácil. Os pais têm uma missão complexa e não é fácil encontrar equilíbrios. Não se pode deixar que as crianças decidam por elas o que fazer, mas também não se podem adultizar antes do tempo. A competividade pode ajudar no desenvolvimento, mas levada ao extremo gera conflito, comportamentos agressivos ou depressivos. Tem de se valorizar a tolerância, a diferença, a bondade. Tem de haver tempo para os jogos e as brincadeiras, para os intervalos, para a descontração.

Na passagem para um novo ano, vale a pena atender às palavras do Papa, para a ternura do Presépio e para a certeza que a vida (também nos propósitos) passa por pequenos gestos, concretos e reais. “Quem não é fiel no pouco, como se lhe pode confiar o muito?”

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 90/05, n.º 4540, 31 de dezembro de 2019

O Rei às nossas mesas

Chega a esta altura e, ao fechar os olhos, e ao imaginar a sua próxima Ceia de Natal, a tradição portuguesa surge de imediato no seu imaginário. Na noite de 24 de dezembro, noite de consoada, temos de ter, nas nossas travessas, o nosso bacalhau.  

Para descobrir porque é que o bacalhau faz parte da nossa tradição temos de recuar até a Idade Média. Os cristãos faziam jejum, nas principais festas católicas, quer no Natal, quer na Páscoa, e o bacalhau era o “peixe” mais barato, logo mais acessível a todas as famílias.

Mesmo, quando o jejum por altura do Natal desaparece, a tradição de comer bacalhau persiste, até aos dias de hoje, e não acontece, apenas, no nosso país, pois os nossos emigrantes levaram com eles o rei salgado das nossas mesas.

A Voz de Lamego quis saber se a tradição ainda é o que era e fomos perguntar às pessoas. Hugo Borges, de 34 anos, diz que “o bacalhau está sempre na mesa, embora cozinhado de duas formas. O cozido para a maioria das pessoas da minha família e o bacalhau com broa, para os mais jovens, onde me incluo”. António, 50 anos, lembra-se desde criança de ter o bacalhau e o polvo na mesa de casa, “é uma tradição que se manteve, mesmo após o casamento e o nascimento do meu filho, até hoje”.  Maria Sequeira, 22 anos, gosta de bacalhau e “se tivesse uma ceia de Natal sem ele, não seria a mesma coisa”, refere a jovem, de sorriso rasgado.

Portugal é o maior consumidor de bacalhau do mundo, sendo responsável por 25% do consumo global. Por isso, no dia 24 de dezembro, em vários países, em fusos horários diferentes, portugueses em Portugal e emigrados terão na mesa bacalhau, com certeza, espalhadas as raízes da nossa tradição.

Os maiores especialistas deixam a dica que se o bacalhau for demolhado mole, não demolha tão bem, tem de ter cor de palha.

Neste Natal, já sabemos, dentro de dias, teremos bacalhau cozido com batatas e couves, temperado com azeite da nossa região.

Demolhar…

Saiba que para demolhar de forma correta o bacalhau deve: Lavar o bacalhau em água fria corrente para retirar o excesso de sal à superfície; colocar num recipiente com água fria (a menos de 8ºC), com a pele virada para cima e totalmente coberto pela água; reservar o bacalhau, de preferência no frigorífico, para manter a água bem fria durante 24 ou 36 horas, de acordo com a grossura das postas; renove a água até 3 vezes por dia.

Valor nutritivo:

O bacalhau é um peixe com baixo teor de gordura (0,1% da DDR por 100g), rico em proteína de alto valor biológico, com quantidades apreciáveis em vitamina D, fósforo, potássio e magnésio. O bacalhau é particularmente rico em selénio, que integra diversas enzimas com capacidades de proteção das células do organismo contra os radicais livres de oxigénio responsáveis.

Apesar de demolhado, podemos verificar que o bacalhau ainda apresenta quantidades relativamente elevadas de sal (cerca de 3g por 100g), pelo que a adição de sal durante a confeção se torna desnecessária.

Andreia Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 90/04, n.º 4539, 17 de dezembro de 2019

Entrevista de Andreia Gonçalves a Catarina Narciso, Mrs. Portugal

“PARA MIM O NATAL SIGNIFICA FAMÍLIA”

Entrevista conduzida por Andreia Gonçalves

A Miss Viseu 2019, Catarina Narciso, de 27 anos, foi eleita, no início deste mês, na Gala Final da Miss Queen Portugal “Mrs. Portugal”. Foi um presente de Natal antecipado?

Sem dúvida. Foi o melhor presente que me poderiam dar! Será algo que ficará para sempre na minha memória.

A Catarina é açoriana e vem ganhar um concurso de beleza a Viseu. Como surgiu esta oportunidade?

Sou natural dos Açores, vim para Coimbra tirar a minha licenciatura e no seguimento do estágio vim para Viseu, durante um mês, e foi uma cidade que me cativou desde o primeiro momento. Para além disso, o amor da minha vida é de Viseu e algumas das minhas melhores amigas. Após terminar o curso ainda fui um ano para os Açores, no entanto tinha deixado uma parte de mim em Viseu. Lutei, regressei e com o incentivo do Diretor do Grupo Peixoto, Nuno Peixoto, decidi inscrever-me no concurso Miss Viseu 2019. Acabei por ganhar o título e assim realizei um sonho de menina. tornar um sonho em realidade.

Quais são as expectativas da nossa Mrs. Queen Portugal para a representação que fará do nosso País, no próximo ano, na Malásia?

As expectativas são muito altas, pois para alem de querer superar-me quero honrar o nosso país, a minha cidade e todas as pessoas que confiaram e confiam no meu trabalho. Acho que essa é a melhor forma de agradecimento a todas as pessoas que me apoiam diariamente. Quero por isso vencer e trazer para Portugal, e mais concretamente para Viseu, um motivo de orgulho.

Qual é o seu objetivo mais ambicioso para a carreira de modelo?

Neste momento já estou a realizar um dos meus objetivos, que era conseguir ganhar um título que me levasse a poder representar Portugal, internacionalmente. A partir daí um dos principais objetivos é ficar bem classificada e conseguir levar Portugal o mais longe possível. Outro objetivo pessoal é poder ser a Voz das Mulheres e poder representar a nossa força e capacidade de luta.

Certamente que tem princípios que a guiam neste percurso. O que pode aconselhar a jovens que sonham com o difícil mundo da moda?

Antes de mais gostava de explicar a diferença entre ser Miss e ser modelo de passerelle. Apesar de haver uma associação entre ambas, o conceito e o objetivo são distintos. De forma abreviada, uma modelo “utiliza” o seu corpo e o seu desfile para dar visibilidade a uma marca, um produto. Já uma Miss, “utiliza” a sua visibilidade, a sua voz, a sua postura, conhecimentos, entre outros para tornar este um mundo melhor. A busca pela Mulher que possa servir como referência na sociedade atual em campos diversos tais como defesa ambiental, das causas sociais e da promoção da saúde. A Embaixadora Portuguesa em todo o Mundo. Dito isto, para além de gostar mesmo muito deste mundo e de tudo que o envolve, o facto de podermos aplicar a nossa “Beleza pelo Bem” torna-o ainda mais especial, poder representar a Mulher, a sua força, é um orgulho para mim. Eu aconselho a todas as meninas que tenham o sonho de serem a cara e a voz de uma causa, a deixarem o medo de lado e a inscreverem-se, por exemplo no concurso Miss Viseu 2020, cujas inscrições já estão abertas. Aproveito para lhes dizer sejam fortes e acreditem que é possível tornar todos os nossos sonhos realidade.

Quem lhe dá a maior motivação para continuar, com garra e determinação, neste percurso?

A minha família é essencial, o meu companheiro, os meus amigos e a minha agência, Grupo Peixoto. São pessoas que me motivam imenso e que me ajudam a ter confiança fazendo com que acredite que tudo é possível. Devo dizer que ter o apoio de pessoas que não me conhecem pessoalmente, também me motiva. Encoraja-me receber mensagens das pessoas com palavras simpáticas e de incentivo.

Como estamos nesta época tão especial. Qual é o significado do Natal para si?

Para mim o natal significa família, acima de tudo. Estar com a minha família, estarmos todos juntos e criarmos momentos para a posterioridade. A vida passa demasiado rápida e se não aproveitarmos esses momentos, mas tarde iremos arrepender-nos.

Qual foi o presente de Natal que mais gostou de receber, quando era criança?

Um presente em específico não tenho, pois tanto eu como a minha irmã nunca fomos de pedir muito e ficávamos felizes por qualquer coisa que nos dessem. Da infância o que mais recordo, e o que mais gostávamos, era de ouvir o sininho do Pai Natal, pois aí sabíamos que “ele” estava em nossa casa a deixar as nossas prendinhas.

O que faz parte da sua tradicional ceia de Natal?

O camarão e o bacalhau não pode faltar, no entanto não gosto de bacalhau e então fazem sempre um “prato especial” para mim, que costuma ser lombo assado com batata-doce. A minha avó é apaixonada pela arte de cozinhar, então temos uma mesa sempre muito bem recheada. Ter os meus sobrinhos pequenos torna a noite de natal ainda mais mágica, pois “obriga-nos” a criar o ambiente para a chegada do Pai Natal. É para mim uma noite muito feliz.

Imagine que tinha o poder de cuidar do nosso País por um ano. Quais seriam os seus raios de ação e porquê?

Na minha opinião, pequenos gestos fazem a diferença!

A base de tudo está na Educação, é fundamental ensinar as crianças a cuidar do nosso planeta,

nomeadamente, a reciclar, a não deitar lixo para o chão. Campanhas de sensibilização, organizar grupos para limpar praias, florestas, criar mais pontos com ecopontos, fornecer a todos os residentes caixotes de lixo de reciclagem. Acredito que desta forma não haveria desculpas para não reciclar. Poderíamos também criar alternativas ao plástico, algo que já estamos a fazer, o caso do uso de sacos de pano, garrafas reutilizáveis, entre outros, mas com mais força, ainda.

Contudo e devido ao fator do nosso país ser muito afetado pelos incêndios, é importante, na minha opinião, investir na plantação de árvores e claro tendo sempre em conta as espécies mais recomendadas para o determinado solo que será reflorestado, bem como, a identificação do clima e altitude. Mas se cada um de nós pensar nos seus atos e corrigir algo que está a fazer de forma incorreta, acredito que já estaremos a fazer a diferença, pois somos uma comunidade e cada um de nós, fazendo o seu papel, terá um futuro melhor.

in Voz de Lamego, ano 90/04, n.º 4539, 17 de dezembro de 2019

Editorial Voz de Lamego: Um Menino que é bênção e luz

Quando uma criança nasce é uma bênção, enche a casa e a família, traz luz e brilho ao lar, enriquece a Igreja e a sociedade, torna viável o futuro da humanidade e possibilita que este mundo seja habitável e possa ser admirado pela beleza com que foi criado por Deus e transformado pela ação humana.

Uma criança que nasce deveria ser uma bênção luminosa.

Mas nem sempre é assim.

Há crianças cujo nascimento acentua desgraças, escuridão e treva, ruturas e pobrezas.

Há crianças que nunca chegarão a nascer, porque incomodariam os pais, seriam mais uma fonte de despesa, de preocupação, de desgaste.

Há um ror de situações problemáticas. Devemos colocá-las na nossa oração e confiá-las ao carinho misericordioso de Deus que é Pai e Mãe (João Paulo I).

Há muitas situações que merecem a nossa atenção, pois são provocação ao nosso compromisso social e político. E temos tantas formas de o fazer: os meios de comunicação social, as redes sociais, o voto, as campanhas a favor da vida, os debates e reflexões públicas, as campanhas de solidariedade (não apenas neste tempo, mas ao longo de todos os segundos do ano) que beneficiarão as pessoas mais frágeis, as instituições que apoiam mães solteiras ou vítimas de violência doméstica, que acolhem crianças desprotegidas ou famílias desgovernadas, dispondo de tempo para o voluntariado e contribuindo com generosidade e, sem recorrer nunca às coscuvilhice, procurar intervir em situações de violência, verbal, física e emocional, maus tratos ou descuido com crianças mas também com pessoas idosas, situações de injustiça e pobreza. Há santos à porta mas, sem o sabermos, por distração ou por pressas nos nossos nadas, também há pobres que precisam de ajuda ou de voz, ou de carinho ou de palavras amigas.

Estamos a ficar velhos. O lugar dos idosos há de ser valorizado, pela sabedoria a comunicar aos mais novos e à sociedade e porque, em todo o caso, estamos cá por eles, porque foi através deles que Deus nos deu a vida.

Estamos a ficar velhos. Sobretudo nas terras do interior e nos países ocidentais. Muitos dos problemas económico-financeiros têm a ver com a falta de crianças e jovens. A população está a morrer, está envelhecida e não se renova. As pessoas que estão em “idade ativa” são cada vez menos em relação às gerações anteriores, além da esperança média de vida ter aumentado muito.

Estamos a ficar velhos. Estamos a morrer. Mas Aquele Menino vem para nos dar vida e vida em abundância (Jo 10, 10). O Papa Francisco tem alertado para um género de egoísmo que nos conduz à morte, a preferência por investir num animal doméstico ao invés de um filho. Até agora, muitos casais tinham apenas um filho, agora há casais que não estão para isso!

Há muitos ponderáveis, mas talvez seja tempo de pensar mais nas pessoas e fazer com que as percentagens económicas sejam para combater desigualdades, criar oportunidades, erradicar a pobreza, proteger a vida, o ambiente.

Ainda não morrermos, ainda há esperança. Que o Deus Menino seja Luz, Bênção e Vida. Santo Natal.

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 90/04, n.º 4539, 17 de dezembro de 2019

A História do Bolo Rei

Era uma vez,

num lugar e tempo, muito distantes, que se designava Roma antiga, que nasceu a tradição de eleger o rei da festa, durante as celebrações pagãs e religiosas. Havia grandes banquetes e ditava a sorte através das favas, quem seria o rei daquela festa.

A Igreja Católica achou esta ideia tão interessante e porque decorria, anualmente, em dezembro, decidiu relacioná-lo com o período de tempo entre o nascimento de Jesus e o dia dos Reis, a 6 de janeiro, que ficaria marcado por uma fava que apareceria no bolo Rei. Seria doce e “representaria os presentes oferecidos pelos Reis Magos ao Menino Jesus aquando do seu nascimento. A côdea simbolizava o ouro, os frutos secos e cristalizadas representavam a mirra, e o aroma do bolo assinalava o incenso. Ao avistarem a Estrela de Belém que anunciava o nascimento de Jesus, os três Reis Magos disputaram entre si, qual dos três teria a honra de ser o primeiro a entregar ao menino os presentes que levavam. Como não teriam conseguido chegar a um acordo e com vista a acabar com a discussão, um padeiro confecionou um bolo escondendo no interior da massa uma fava. De seguida cada um dos três Reis Magos pegaria numa fatia, o que tivesse a sorte de retirar a fatia contendo a fava seria o que ganharia o direito de entregar em primeiro lugar os presentes a Jesus. O dilema ficou solucionado, embora não se saiba se foi, Gaspar, Baltazar, ou Belchior o feliz contemplado, segundo nos conta uma lenda bem antiga”.

Contudo foi na corte do rei Luís XIV que surgiu o “bolo Rei”, que se fazia especificamente para a época de Natal. Estando, assim bem documentada a sua origem.

Voltas e mais voltas na história, este delicioso manjar chegou a Portugal e, a partir de 1870, os bolos traziam escondido uma fava simbólica e, ainda, um brinde. 

A Confeitaria Nacional, na baixa pombalina, em Lisboa, foi a primeira casa em Portugal a realizar esta iguaria natalícia, o que fez com que melhorassem a qualidade das especialidades daquela casa e que granjeasse grande fama no nosso país. Um deles foi o célebre confeiteiro Gregório, que se baseou numa receita secreta de Bolo Rei que Baltazar Castanheiro Júnior trouxera de Toulouse, em 1869, contrariando outros relatos que indicam como ter vindo de Paris. Orgulha-se, esta confeitaria, de ter trazido a receita e a manter integralmente como receita francesa do sul de Loire. Balthazar Castanheiro Júnior, que aos seus méritos de confeiteiro juntava os de artista, trouxe uma cópia do quadro “Gateau des Rois”, de Jean-Baptiste Greuze, que durante anos teve exposto no seu estabelecimento como alusão a este famoso bolo. Como curiosidade é interessante ainda relembrar que, inicialmente, além da fava, posta em todos os Bolos Rei, alguns ocultavam prémios valiosos em ouro ou prata. Durante a quadra natalícia, a Confeitaria Nacional oferecia aos lisboetas uma exposição de tudo quanto de mais delicado e original a arte dos doces podia então produzir e claro o Bolo Rei. Assim o Bolo Rei atravessou com êxito os reinados de D. Luiz I, D. Carlos e D. Manuel II. De referir que a Confeitaria Nacional, devido à grande qualidade dos seus produtos, recebeu, em 1873, do rei D. Luiz I de Portugal, o alvará que a torna fornecedora oficial da Casa Real, condição essa que se manteve até à implantação da República, em 1910. Esteve ainda presente e ganhou prémios em exposições internacionais como a Exposição Universal de Viena de Áustria de 1873, a de Filadélfia de 1876; recebeu uma medalha na Exposição Universal de Paris de 1878 e na de Lisboa de 1884. A Confeitaria Nacional, um dos ex-libris da cidade de Lisboa, é uma casa que conta já com 187 anos de atividade comercial e industrial, sem nunca ter saído da mesma família, sempre no mesmo local e sempre com o mesmo critério, e a especialidade que a marcou, o famoso Bolo Rei. Aos poucos, outras confeitarias da cidade passaram também a fabricar o Bolo Rei, originando assim várias versões diferentes. Tradicionalmente este bolo de forma redonda, com um grande buraco no centro, é feito de uma massa fofa e branca, misturada com passas, frutos secos, e frutas cristalizadas.

Na cidade do Porto, o Bolo Rei foi introduzido em 1890, por iniciativa da Confeitaria Cascais, segundo uma receita que o proprietário, Francisco Júlio Cascais, trouxera de Paris, receita muito semelhante à da Confeitaria Nacional.

Salazar chegou, posteriormente, a proibir a colocação da fava e do brinde, no bolo rei, cujo nome também não agradava, mas anos mais tarde voltou a ser permitido.

O Bolo Rei está em cada mesa de Natal, em Portugal, e não se limita a ser um bolo vistoso e de um sabor único, é, também, um símbolo da nossa tradição.

 

Andreia Gonçalves,  in Voz de Lamego, ano 90/03, n.º 4538, 10 de dezembro de 2019

Andreia Gonçalves entrevista Presidente da Câmara de Tabuaço

O Bolo Rei de Tabuaço

O Bolo Rei de Tabuaço tem fama e diz quem conhece que é realmente delicioso. O segredo ninguém o conhece, para além dos pasteleiros do concelho. 

Por isso, nos dias 7 e 8 de dezembro, havia vários bolos reis, cheios de cor, disponíveis aos olhos e ao paladar de todos os que passaram no Palácio do Gelo, em Viseu.

Foi com Carlos Carvalho, Presidente da Autarquia de Tabuaço, que a Voz de Lamego tentou perceber a importância de levar esta iguaria natalícia até à capital de distrito.

Porque é que o bolo rei de Tabuaço é tão especial? 

Essencialmente pela forma como é confecionado desde sempre! A receita da massa, que continua ainda hoje a ser segredo, aliada à qualidade da fruta e dos frutos secos conferem-lhe características únicas que o transformam no melhor dos bolos reis!!

Porquê, na sua opinião, foi importante fazer uma mostra deste produto, em Viseu, no passado fim de semana? 

Entendemos que um produto tão especial merece ser o mais amplamente divulgado! E para além das diversas ações que ao longo do ano o Município leva a cabo nesse sentido, entendemos aproveitar esta época festiva para uma promoção de grande escala na nossa Capital de Distrito. Convidamos todos os produtores a marcar presença e assim poderem dar a conhecer, e provar, a todas as pessoas, que passarem pelo Palácio do Gelo nesses dois dias, o Bolo Rei de Tabuaço.

Gosta de bolo rei? É para si algo que não pode faltar à sua mesa, nas festividades natalícias? 

Como qualquer tabuacense, gosto imenso de bolo rei! E não pode faltar na mesa de Natal. Aliás, é também nossa intenção, bem como de quem produz, alargar a época de produção ao resto do ano. Porque, apesar de todos associarem este produto apenas a esta quadra festiva, acreditamos que as suas características únicas, bem como a sua, enorme, qualidade justificam a que esteja na nossa mesa todos os dias.

O Natal é uma época especial. Quer deixar uma mensagem a todos? 

Gostaria de desejar a todos um Santo e Feliz Natal e um 2020, pleno de realizações. Em especial a todos os nossos emigrantes que não vão poder estar juntos de nós e aqueles que, infelizmente, por momento menos bons estejam a passar.

E porque acredito que todos nós nesta época acabamos por ser melhores seres humanos que nos restantes dias do ano, deixar o desafio, sem querer cair no lugar comum, de tentarmos fazer deste estado de espírito uma constante e trazermos mais Natal às nossas vidas e às de quem nos rodeia.

in Voz de Lamego, ano 90/03, n.º 4538, 10 de dezembro de 2019

Exposição de Presépios na Paróquia de Cabaços

Na Paróquia de Santo Adrião de Cabaços, realizou-se no passado dia 8 de dezembro, no Dia da Imaculada Conceição, a venda de artesanato de Natal, nomeadamente de presépios.

A ideia surgiu a partir do grupo de jovens juntamente com mais três paroquianas, falámos com o nosso Pároco e ele disse-nos logo que podíamos avançar com esta ideia.

Todos juntos levámos esta ideia avante, a fim de angariar dinheiro para o restauro do altar do Sagrado Coração de Jesus.

À medida que íamos fazendo as peças natalícias, iam sempre surgindo novas ideias.

Foram imensos serões de trabalho com muito cansaço, mas nunca baixámos os braços, com o esforço e dedicação de todos nós conseguimos fazer tudo a tempo e assim atingir o nosso objetivo.

O balanço da tarde foi bastante positivo.

Queremos agradecer a quem dedicou o seu tempo à realização e organização deste evento, agradecer também a quem despendeu do seu tempo para ir à exposição e assim ajudando na compra de presépios.

Um agradecimento especial ao nosso Pároco, o Sr. Padre Diamantino Duarte, pelo apoio que nos deu desde o início até ao fim desta iniciativa.

Sem a ajuda de todos, não se tinha conseguido realizar esta exposição. Um grande obrigado a todos.

Grupo de jovens de Cabaços, in Voz de Lamego, ano 90/03, n.º 4538, 10 de dezembro de 2019

Fábio Ribeiro: Pela defesa do ambiente (e da Greta)

Certamente terá visto muitas vezes nas notícias uma rapariga de ar pacato e tranquilo, com tranças Heidi, esbranquiçada e com uma certa fragilidade aparente. Quando ela fala, o mundo parece invadir-se de um certo deleite, embora uma grande fatia de pessoas esteja mais interessada em bater na menina. Do que fala ela afinal? De ambiente, de salvar o planeta. Só disto.

O nome dela é Greta Thunberg, tem 16 anos e é sueca. Saltou para as bocas do mundo porque criou um movimento chamado “Sextas-feiras pelo futuro”, em que jovens suecos, liderados por Greta, faltam às aulas no último dia da semana, e protestam contra as políticas que não incluem o meio ambiente nas preocupações governativas. É, de facto, um movimento um pouco estranho, é verdade, mas não tem nada de negativo, aparentemente.

Entretanto esta ativista, que chegou a Lisboa na semana passada vinda de barco desde os EUA, tem sido alvo de uma intensa polarização – ou seja: há quem a ame e troque juras de amor com ela; há quem veja nela todo o ódio do mundo e o exagero de uma “não questão” como o clima. Estive muito atento às reações dos políticos e basicamente vi duas marcas muito claras: a esquerda a aplaudir e endeusar Greta; a direita a troçar, menorizar e quase pisar todo o trabalho desta miúda. Como se, em matéria de ambiente, ser-se de esquerda ou direita fosse fundamental.

É um autêntico disparate o destaque que os meios de comunicação social têm dado a Greta. Efetivamente ela não diz nada de novo. Zero. Ela é apenas uma voz. Há várias décadas que existem diversas personalidades que apoiam o clima nesse destaque muito pessoal. É por ser miúda? É porque devia estar a estudar em vez de andar em greve? É mesmo isso o fundamental?

Greta tem endurecido o discurso. Falou em políticos que “lhe roubaram os sonhos”, fala num clima ambiental que depende do “patriarcado”. Parece que, por vezes, ela estica a corda, por alguma razão que possa ter. Efetivamente, toda a campanha de ódio perante alguém que pretende apenas colocar a preocupação ambiental na agenda pública, com ações concretas, tem sido miserável. Nesta procura pela próxima heroína do Mundo, patrocinada pelos média, assiste-se a esta novela do sofá, gritando contra a televisão: “esta Greta é mesmo a maior!” ou “raio de miúda, com aquelas tranças de menina mimada e rica… sabe lá ela o que é vida?”. Depois levantamo-nos e fazemos um chá. E a vida continua.

Fábio Ribeiro, in Voz de Lamego, ano 90/03, n.º 4538, 10 de dezembro de 2019

Editorial Voz de Lamego: De Greta Thunberg à ecologia integral

Por estes dias a questão do ambiente tem preenchido páginas e páginas de jornais, têm-se multiplicado as partilhas, os comentários, têm-se extremado posições, colocando-nos na lógica mais tradicional da contraposição, da exclusão e do fundamentalismo. Porém, a questão ecológica não pode deixar de estar presente no quotidiano. Mais que os intervenientes, importa, a meu ver, a mensagem veiculada.

Os holofotes têm estado direcionados para Greta, jovem sueca, de 16 anos. As suas intervenções na Suécia, na ONU, em Lisboa, na manifestação de Madrid, têm permitido que a questão ambiental não saia das primeiras páginas, dos telejornais, das redes sociais. Saliente-se, desde logo, o aproveitamento político, quando as suas palavras insistem na falta de vontade política em alterar a pegada ecológica. Veja-se que líderes partidários estiveram na chegada a Lisboa. E a propósito, veja-se também quem interveio na manifestação das forças de segurança. De um lado o PAN, do outro lado o CHEGA.

Por outro lado, outra visão, mais trumpista (os EUA, com Ronald Trump, não têm qualquer interesse em respeitar acordos que restrinjam a poluição atmosférica ou a utilização exaustiva de recursos naturais, desde que momentaneamente a indústria americana se sobreponha e abafe qualquer concorrência), defende que a natureza, por si só, é autorregenrativa e, portanto, não é necessário fazer correções no caminho que se está a trilhar. Neste sentido, ataca-se a mensageira.

Greta Thunberg também me pareceu burguesa e exageradamente revoltada. Com os comentários e reflexões que fui lendo e escutando, e vendo algumas das suas intervenções equilibradas, como em Lisboa, apercebi-me que seria mais relevante a mensagem que veicula, mas também os debates que tem provocado.

É importante ler também e escutar os que não concordam com Greta e com outros movimentos mais verdes, se é que de verdes têm alguma coisa. Como em tudo na vida, os extremismos, os excessos e os exclusivismos precisam de ser purificados. Como não lembrar quando um reitor proibiu a carne de vaca na universidade! Será que ele se desloca a pé? Medidas de propaganda por si só, me parece, não surtem efeito, quando muito acentuam fanatismos. Só porque acho que a comida vegetariana é mais saudável, terei o direito de obrigar os outros a serem vegetarianos? O equilíbrio, o bom senso, a quantidade, como alguém dizia. Há tantas formas de nos comprometermos com o ambiente.

Mas não basta ser defensores do ambiente, se continuarmos a criar fossos e muros entre ricos e pobres, a descartar os mais frágeis, a eliminar os que não têm voz ou não têm força suficiente, a excluir os que professam outra ideologia ou outra fé. A ecologia, no dizer do Papa Francisco, terá de ser integral, abrangendo todo o homem e o homem todo. Há países em que é crime destruir as “ovas”, mas é legal o aborto ou a eutanásia, a pedido, em qualquer situação ou por qualquer motivo!

Para quê termos uma bela floresta se não tivermos pessoas que a contemplem?

Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 90/03, n.º 4538, 10 de dezembro de 2019

Andreia Gonçalves entrevista Paulo Pinto

“Este território das Terras do Demo poderia ser um espaço literário de referência em Portugal”

Entrevista conduzida por: Andreia Gonçalves

O livro “Aquilino Ribeiro e as Terras do Demo: o marketing num território literário” é uma homenagem ao mestre e aos lugares pelos quais era, verdadeiramente, apaixonado. Paulo Pinto é mestre em Comunicação e Marketing, e o que era uma tese passou a ser um livro, apresentado, em Sernancelhe, no final, de um colóquio especial, que encerrou as comemorações do centenário da publicação da obra “Terras do Demo”.

Por isso, vamos fazer uma viagem pelas Terras do Demo, enquanto entrevistamos, este promissor autor e perceber este seu estudo.

 O ponto de partida para este roteiro, de Aquilino Ribeiro, tem de ser o pátio e a casa onde nasceu o escritor, em 1885, no Carregal, lugar que deu origem ao livro “Cinco Réis de Gente”, obra que cronologicamente situa Aquilino, nos primeiros dez anos de vida, antes de ir estudar para o Colégio da Lapa.

E aqui, lanço ao Paulo Pinto, a primeira pergunta. Como nasceu a ideia de escrever este livro? 

O livro “Aquilino Ribeiro e as Terras do Demo, o Marketing num território Literário” é a materialização da tese de mestrado em Comunicação e Marketing que realizei na Escola Superior de Educação de Viseu. O desafio para que passasse de um trabalho académico a livro foi da editora Edições Esgotadas, em particular da Professora Ana Maria Oliveira e da Dra. Teresa Adão, que entenderam que este estudo poderia ser útil para os concelhos de Sernancelhe e Moimenta da Beira e poderia despoletar, de certa forma, a ideia de que estamos perante um território único, porque aqui nasceu e viveu o escritor Aquilino Ribeiro, e que o turismo cultural, centrado na literatura, pode ser determinante para o desenvolvimento desta região. Ora, com esta certeza por parte da editora, e o apoio dos Municípios de Sernancelhe e Moimenta da Beira, o livro nasceu e faz parte agora da Coleção Saber, das Edições Esgotadas, distinguido com um extraordinário prefácio do professor Aquilino Machado, neto de Aquilino Ribeiro, e professor do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa.

Porquê do lançamento ser feito neste ano tão especial de centenário da edição da obra “Terras do demo”? 

O desafio surgiu, em primeiro lugar, da parte do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Sernancelhe, Dr. Carlos Silva, quando começou a ganhar forma a ideia de encerrar as comemorações do Centenário da edição da obra Terras do Demo com os Colóquios “Aquilino, Letras e terra”, iniciativa que trouxe ao Concelho dois ex-ministros da educação, um ex-ministro da cultura e vários académicos que são dos mais conceituados especialistas nacionais em Aquilino Ribeiro. Depois, fazia todo o sentido dar a conhecer o resultado de uma investigação que vem confirmar que as Terras do Demo têm as qualidades e o potencial para serem um território literário de exceção em Portugal. Por isso, foi muito importante que o livro fosse apresentado neste Colóquio, evento que marcou um ponto final num ano de intensas comemorações por todo o País, que envolveram, desde abril, os municípios de Sernancelhe, Moimenta da Beira e Vila Nova de Paiva – os legítimos herdeiros das “Terras do Demo”, que durante 2019, demonstraram que, na realidade, têm orgulho na designação que Aquilino lhes atribuiu, estão conscientes de que a marca Terras do Demo tem cada vez maior valor, e que partilham de um território que reúne elementos turísticos em quantidade e qualidade para proporcionar experiências únicas aos visitantes e para se afirmar a nível nacional. Ler mais…