Taizé, um caminho de confiança e alegria
Escrever sobre o que se vivencia em Taizé durante uma semana não é uma tarefa fácil, pois, por um lado, a dimensão e a intensidade do que lá se experiencia não consegue nunca ser traduzida por palavras, faladas ou escritas, e, por outro lado, as expectativas, os anseios, e em consequência, a própria vivência da peregrinação, são tão pessoais que se corre o risco de se apresentar uma visão com um tom demasiado subjetivo no qual nem todos os participantes se revejam. Mas esse é um risco que se corre sempre que comunicamos, seja sobre que assunto for.
Ao partir para Taizé, muitos procuram fazer uma pausa no louco frenesim do mundo, “recarregar baterias” como se costuma dizer, procurar forças renovadas para enfrentar os desafios, ou buscar algo de novo. E também há quem vá em busca de respostas, em momentos difíceis do seu caminho, de como continuar a viver em meio ao sofrimento, até se é possível voltar a amar, ou procure reconfortar a sua fé. Depois de ter vivido Taizé e falado com tantos que lá estiveram, serão raros aqueles que não encontraram nenhuma destas coisas, senão mesmo todas. Julgo que vários aspetos evidentes da dinâmica que se vive em Taizé concorrem para que assim seja, e acho que todos aqueles que lá estiveram os reconhecerão.
Para começar, naquele pequenino recanto da Borgonha, chegamos a esquecer-nos de que estamos em França; a internacionalidade de Taizé, o seu ecumenismo cristão, a Babel em que se vive imerso, dão-nos um sentimento universalista de irmandade que age em nós de modo impercetível. Depois, o ritmo quotidiano, pautado pelas três orações comunitárias na igreja da Reconciliação, pela reflexão comum e pelos grupos de partilha, e pelas várias atividades nas quais cada um se pode envolver de acordo com as suas motivações, seja nos diversos ateliers e workshops, seja no trabalho comunitário ou no coro. E temos especialmente os momentos de silêncio, que são um ponto essencial para uma vivência profunda de Taizé e acima de tudo para o encontro de cada um consigo próprio. Aqueles dez minutos de silêncio em cada uma das orações comunitárias e os vários momentos, mais ou menos longos, em que nos recolhemos na nossa inteira e não escondida verdade perante Deus, seja na cripta da igreja, seja no bosque ou junto ao lago, serão talvez os instantes que mais nos trabalham no sentido da nossa própria busca e as alturas em que mais deixamos que Ele nos trabalhe. Porque Ele trabalha nas imperfeições e com as imperfeições deste mundo, tal como foi precisamente recordado nas reflexões comuns da semana passada.
Pisando evidentemente o risco da subjetividade, direi assim que a peregrinação em Taizé é um itinerário em crescendo, em que se vai sentindo de maneira mais e mais presente a cada dia a tal “renovação de forças” e em que de forma serena vão surgindo fontes de paz para as nossas inquietações. Não é, claro está, uma espécie de panaceia para todos os problemas ou uma resposta universal para todas as interrogações, mas o que posso dizer (salvaguardando as expectativas e as buscas individuais de cada um) é que traz apaziguamento a questionamentos e dores lancinantes que nos torturam tantas vezes e oferece uma energia serena que nos permite encontrar, ou reencontrar, o sentido da Alegria através do caminhar sofrido deste mundo. Nesse sentido, as orações comunitárias na igreja da Reconciliação, na sexta-feira e no sábado (em Taizé vive-se o tríduo pascal todas as semanas), foram um momento de catarse, em que o tal “crescendo” a que aludi atingiu o zénite e se libertou muito do que é “fardo”, do que é negativo, para se tornar esperança, e em que se ganhou paz para seguir em frente. E será isso dar testemunho da Alegria no meio das imperfeições deste mundo. É essa a mensagem de esperança renovada que Taizé nos oferece.
Filipe Pontes – Paróquia de Almacave,
in Voz de Lamego, ano 88/36, n.º 4473, 21 de agosto de 2018