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FALAR DE FUTEBOL | Editorial Voz de Lamego | 3 de julho de 2018
FALAR DE FUTEBOL
Será uma banalidade dizer que o futebol (sobretudo falado) ocupa um lugar destacado no panorama português. E não foi apenas agora por causa da participação do país no campeonato do mundo. Um qualquer visitante, não familiarizado e não avisado desta tendência lusa, questionar-se-á sobre as prioridades, os objectivos ou as dificuldades do nosso povo.
Exaustivamente e não isentos de “clubite”, comentadores e analistas debruçam-se sobre as perspectivas, os resultados, as intrigas e, claro, o trabalho dos árbitros. Certamente que o assunto tem e merece o seu lugar. Mas a vida dos jovens que precisam saber as notas, dos professores em luta pelos seus direitos, dos doentes em lista de espera, do atrasado em investimentos, da desertificação do interior, das políticas de natalidade, etc, também merecem vez e voz.
Noutros países europeus, onde o fervor clubístico não é menor e o amor à selecção nacional não se questiona, não se gastam tantas horas em análises sobre o que já não volta e em debates acalorados, protagonizados por comentadores pagos para o efeito. E é graças a todo este destaque que alguns dirigentes adquirem estatuto de figuras públicas e os seus actos motivam contínuos debates.
Talvez o interesse seja passageiro e, em breve, tudo volte ao normal. E o normal será, porventura, divulgar e promover o desporto e os desportistas, dar protagonismo aos seus executantes e debater sadiamente assuntos relacionados, sem ofuscar a realidade mais vasta em que a vida da sociedade acontece.
Poder-se-á dizer que só vê quem quer e que só alimenta a conversa quem está interessado. E é verdade.
Será, então, de esperar que, quando consumidores e adeptos derem conta de que nada disto resolve os seus problemas, tudo volte ao seu lugar e à importância devida. Continuarão a falar do assunto, mas relativizando-o.
Pe. Joaquim Dionísio, in Voz de Lamego, ano 88/31, n.º 4468, 3 de julho de 2018