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Novo livro de D. António Couto: A misericórdia – lugar e modo
No âmbito do Ano Jubilar em curso, D. António Couto escreveu um livrinho, a que deu o título “A Misericórdia – lugar e modo”. Ao longo das 80 páginas somos conduzidos pelas páginas bíblicas, entendendo o vocabulário utilizado e acolhendo a revelação de um Deus amor.
Mais uma leitura para ajudar a viver o Ano da Misericórdia.
Título: A misericórdia. Lugar e modo
Autor: D. António Couto, bispo de Lamego
Edição: Letras e Coisas – Livros, Arte e Design, Soc. Unipessoal, Lda
Páginas: 83 p.
Preço: 2 euros (à venda no Paço Episcopal)
in Voz de Lamego, ano 86/23, n.º 4362, 10 de maio de 2016
De vez em quando – BATISMO – padrinhos ou testemunhas
Prosseguindo o tema do Baptismo, e à volta dele, vêm-me à ideia seis nomes, seis modelos e seis funções: o padre, o pai e o padrinho, a madre, a mãe e a madrinha.
O pai e a mãe geraram a criança para a Vida Humana; o padre e a madre igreja geram a criança para a Vida Divina. Por isso mesmo se chamam padre – pai, e madre – mãe.
Padrinho é diminutivo de pai: paizinho. Madrinha é diminutivo de mãe: mãezinha. Um e outro, compadres, ou seja, “como pais” ou “compais”.
Assim sendo, o padrinho deve ser um segundo pai, e a madrinha uma segunda mãe. O povo sempre disse que, se os pais da criança faltassem, eram os padrinhos quem tinha de tomar conta dela, para a educarem e criarem.
Do padrinho e da madrinha esperava a Igreja e o seu Código que, para além de testemunharem o acto, assumissem o compromisso de ajudarem os pais da criança na educação e no crescimento da sua fé.
Ora, o que se tem verificado (e todos dizem), é que os padrinhos se transformaram em figuras tradicionais, sem responsabilidade alguma, peças quase decorativas que, uma vez por outra, não existindo, até chegaram a ser substituídos por imagens de santos e efígies de padroeiros. Os livros de assentos paroquiais mais antigos o comprovam.
Lá para trás, nos tempos de verdadeira pobreza, o que os pais esperavam dos padrinhos era quase exclusivamente que eles dessem o enxoval, pagassem o pé de altar e ficassem seus compadres para deles receberem apoio, ajuda e amizade. Era por isso que, na medida do possível, se escolhiam pessoas de poderes, de haveres e de influências.
Nesses tempos, quase não existiam casais juntos ou divorciados, e quase todos os católicos eram frequentadores dos Sacramentos.
As coisas foram andando e hoje, com as liberdades individuais de opção que todos têm, e que a Igreja respeita, muitos católicos que os pais escolhem para padrinhos dos seus filhos não estão em condições canónicas para desempenharem tal função: ou porque não são praticantes, ou porque a sua vida moral ou conjugal não está de acordo com os ensinamentos de Jesus nem com as normas estabelecidas pela Igreja. E aí surgem os problemas. Os párocos ficam cada vez mais no dilema de aceitar tudo e tudo deixar correr para não terem problemas nem sofrerem incómodos, ou de cumprirem as normas e obedecerem à sua consciência.
De facto, que testemunho de Fé e de Vida Cristã podem dar aos seus afilhados, padrinhos que não frequentam a Igreja nem recebem os Sacramentos, ou se encontram em situação moral ou conjugal oposta ao Evangelho e às Leis da Igreja?
Não se passa o mesmo na celebração do Matrimónio. O cânone 1108 do Código de Direito Canónico em vigor, exige que a celebração do Matrimónio ocorra com a presença de duas testemunhas.
Ser testemunha não é o mesmo que ser padrinho.
Testemunha, qualquer pessoa adulta e lúcida o pode ser. Basta assistir e assinar. Padrinho ou madrinha, não. Tem que assumir responsabilidades sérias na educação da fé dos afilhados, e ter condições para o fazer.
Assim sendo (quem sou eu para o dizer), já que os padrinhos não assumem na realidade tais responsabilidades, porque continuamos a manter essas figuras decorativas e não os substituímos por simples testemunhas? É que assim, todas estas situações que tantos dissabores causam aos párocos, ficavam automaticamente resolvidas. Para testemunhar um acto ou uma celebração, qualquer um serve.
Mas isso, julgo eu, só o Papa para a Igreja Universal ou a Conferência Episcopal para cada país ou região, o poderão fazer.
Quem sou eu para o exigir?
Quem sou eu sequer para o sugerir?
Pe. Joaquim Correia Duarte, in Voz de Lamego, ano 86/23, n.º 4362, 10 de maio de 2016
JUBILEU DA MISERICÓRDIA | CORRIGIR OS QUE ERRAM
A terceira obra de misericórdia espiritual convida a corrigir os que erram. Não porque quem corrige seja imaculado ou superior, mas porque o acto expressa caridade (amor e não “pena”) ao próximo. Uma correcção que, longe de ser mero moralismo prepotente, visa ajudar a encontrar o caminho, a manter o ritmo, a reformular opções, a busca a reconciliação ou a “limar arestas”. E tudo isso com paciência e respeito.
Corrigir, de forma fraternal, os que erram é o oposto da indiferença. Quantas vidas se terão reencontrado, quantas famílias mantiveram a unidade, quantos percursos profissionais foram aperfeiçoados, quantos atalhos evitados… graças à correcção amiga, desinteressada e oportuna que, no momento certo, contribuiu para ver melhor, para voltar atrás, para avançar?
São Tomás d’Aquino escreveu que “corrigir o que erra é esmola espiritual”. Nesse sentido, a advertência fraterna é um dever e é o oposto do “fechar os olhos”. Às vezes confunde-se “indiferença” com “querer bem” e a “crítica construtiva” com “perseguição e incompreensão”. Não querer saber do outro será sempre pior do que chamar à atenção de forma franca e amiga. No imediato pode até causar desconforto, mas a prazo, aquele que é corrigido reconhecerá o bem que lhe queriam; e quem corrige sempre poderá dormir de consciência tranquila.
A vida que o Senhor nos entregou para viver e o caminho que somos convidados a percorrer não estão isentos de obstáculos e as limitações acompanham-nos. Cada um precisa de estar atento para evitar o mal, mas nem sempre consegue ver tudo. Daí que a proximidade fraterna e o conselho oportuno possam ajudar, tal como nos lembra S. Paulo: “ensinai-vos e admoestai-vos uns aos outros com toda a sabedoria” (Cl 3, 16), porque temos capacidades para nos aconselharmos uns aos outros (Rm 15, 14). E aconselha: “corrigi os indisciplinados, encorajai os desanimados, amparai os fracos, sede pacientes com todos” (1 Ts 5, 14).
A correcção, que implica proximidade e afecto, é fruto da atenção e do cuidado, visando denunciar o erro e salvaguardar a vida e a dignidade daquele que o praticou. Por isso, será sempre importante atender à forma como se faz. Não se trata de algo irreflectido, apressado, explosivo, mas fruto de um amor atento e disponível. Quantas vezes a oportunidade e a verdade do que se diz perdem eficácia por causa da maneira como se disse?
Diante de tudo o que se disse e, sobretudo, atendendo à nossa experiencia no acto “corrigir” e de “ser corrigido”, facilmente concluímos que a humildade é fundamental: quer de quem se aproxima para incentivar à mudança (às vezes seria mais cómodo permanecer indiferente), quer de quem é chamado a acolher o avisado conselho (a tentação da auto-suficiência).
Por mais eloquente que seja o mensageiro e oportuna a mensagem, dificilmente se conseguirá ensinar algo a alguém que se considera acima de qualquer contributo.
Ao contrário, a abertura humilde e confiante para dizer e para escutar quebra a auto-suficiência e acolhe a correcção como um dom.
JD, in Voz de Lamego, ano 86/23, n.º 4362, 10 de maio de 2016