Matar… ou deixar morrer… ou ajudar a morrer
DE VEZ EM QUANDO…
No passado dia 06 do mês corrente de Fevereiro, o Movimento “Direito a morrer com dignidade” apresentou no Porto um manifesto a defender a eutanásia e o suicídio medicamente assistido, assinado por 110 cidadãos. Nesse manifesto, o Movimento defende a despenalização e regulamentação da morte medicamente assistida em Portugal e o direito de as pessoas, em pleno uso das suas faculdades mentais, mas perante um sofrimento profundo ou uma doença incurável, terem a liberdade de escolha, ou seja, a liberdade de decidirem morrer e de pedirem que as matem.
O referido manifesto veio trazer de novo para a ribalta da comunicação e para o campo da discussão, o problema da eutanásia.
Logo a seguir, no dia 15, a jornalista Fátima Campos Ferreira trouxe o tema para debate no programa “Prós e Contras”, programa que eu acompanhei com todo o interesse e atenção.
No dia 15 deste mês, reunido em Fátima, o “Conselho Permanente do Episcopado Português” (desta vez apareceu e funcionou) veio tornar claro que a Igreja defende e afirma que a vida humana é algo sagrado e inviolável que “tem sempre a mesma dignidade, em todas as suas fases, independentemente das circunstâncias, quer externas quer internas”. O cardeal patriarca de Lisboa dissera uns tempos antes que “entrar por aí (pela despenalização da eutanásia, tornando-a legal e livre),é entrar numa porta perigosa, de futuro imprevisível”. De facto, depois de se legalizar a matança de crianças inocentes, pretende-se agora legalizar a matança dos doentes terminais, e depois, podem seguir-se mais coisas…e assim se conseguir a “pureza e a sanidade total” da raça, ao jeito da limpeza de Hitler, da purga de Estaline e de outros semelhantes a eles.
O “Código Deontológico dos Médicos”, publicado em Diário da República a 13 de Janeiro de 2009, proíbe a todos os membros da Ordem “a ajuda ao suicídio, à eutanásia e à distanásia”.
No dia 13 deste mês, o “Conselho Nacional da Associação dos Médicos Católicos Portugueses” manifestou-se publicamente contra a despenalização da eutanásia e do suicídio assistido, defendeu o respeito pela vida humana até à morte natural, e alegou que um assunto desta natureza e gravidade não pode ser decidido pelos deputados na Assembleia da República, sem ter havido uma grande discussão e uma profunda reflexão na sociedade portuguesa.
Dizem-me, e eu também li isso não sei onde, que muitos idosos belgas, holandeses e luxemburgueses com posses optaram por fugir do seu país onde a eutanásia foi despenalizada em 2002, para terras mais seguras, com receio de que os seus herdeiros os condenem à morte antes do tempo…
Com todo o respeito pelos signatários do dito manifesto do Porto, e pelas suas opções de vida e pensamento (gostava que explicassem com clareza a sua visão da pessoa humana e o futuro que lhe oferecem), permitam que eu expresse a minha opinião sobre o assunto.
O 5º Mandamento da Lei Divina, que é também uma lei natural sempre aceite e reconhecida por todos, embora muitas vezes, ao longo dos séculos, desrespeitada por muitos, incluídos os baptizados em Cristo, diz, numa palavra apenas: NON OCCIDES! NÃO MATARÁS!
A Igreja, querendo explicitar melhor o mandamento divino, acrescentou: “NÃO MATAR, NEM CAUSAR OUTRO DANO, A SI OU AO PRÓXIMO, NO CORPO OU NA ALMA.”
Então, e se a vida se tornar pesada, os problemas insolúveis, as dores intoleráveis? E se a doença for tão grave que já não haja esperança de cura ou regressão? Que fazer? Pedir aos outros que nos matem? Pedir aos outros que nos ajudem a matar-nos a nós próprios? Prolongar a nossa vida ou a dos nossos, artificialmente, para além do que é natural e normal?
Há duas opções possíveis que reputo indefensáveis: a primeira é pôr fim, intencionalmente, à nossa vida ou à vida de outrem; a segunda, é prolongar artificialmente a vida, com meios extraordinários, para além da hidratação e da alimentação.
O que eu julgo defensável e normal é respeitar a natureza, e ajudar as pessoas a bem morrer. Ajudar as pessoas a bem morrer, não é “empurra-las da ponte abaixo” para se irem mais depressa. Ajudar as pessoas, bem ao contrário, é animá-las no desânimo, restituir-lhe a esperança, confiar-lhe o nosso braço, entregar-lhe a nossa mão, trazê-las de volta, dando-lhe tudo o que elas precisam, para viverem melhor e para morrerem melhor. Isto é que é ajudar as pessoas a morrer. Bem andou, a meu ver, o Parlamento Francês que, em 26 de Janeiro passado, recusando abrir no seu país no perigoso debate sobre a eutanásia, votou quase por unanimidade o uso da sedação profunda aos pacientes terminais que o solicitem. A sedação retira as dores e o sofrimento, mas não mata nem põe termo à vida.
Lembro-me de ter ouvido o Prof. José Pinto da Costa, então Director do Instituto de Medicina Legal do Porto, numa palestra que veio fazer ao salão do antigo Celeiro de Aregos sobre a morte e o modo de a encarar e viver, dizer o seguinte: Na hora de alguém morrer, e antes de ela morrer, demos-lhe todos os analgésicos que estiverem ao nosso alcance, mas, o melhor analgésico, é a nossa presença e a nossa amizade, apertando-lhe a mão, e afagando-lhe o rosto.
Não sabia o senhor Professor, ou não quis dizê-lo, que mesmo, mesmo, o melhor de tudo, é confortar e ajudar essas pessoas com a Oração, os Sacramentos, e a Esperança Cristã, lembrando-lhes que não vão cair num poço sem fundo e num abismo sem retorno. Bem ao contrário. Deus espera-nos, de braços abertos, como um Pai que acolhe o filho que regressa a Sua Casa. FELIZ DE QUEM TEM FÉ E CAMINHA COM ESPERANÇA.
A Igreja tem sido, e deve continuar a ser, a grande paladina na defesa da sacralidade e da inviolabilidade da vida humana, desde o momento da sua concepção até à sua morte natural. Contra tudo e contra todos.
O tempo lhe dará razão. E o mundo lhe agradecerá.
Pe. Correia Duarte, in Voz de Lamego, ano 86/14, n.º 4351, 23 de fevereiro de 2016