PASTORAL VOCACIONAL: entrar e sair sem compromisso
Muitos são os textos que tentam caracterizar a nossa sociedade, analisando e descrevendo a atualidade, ao mesmo tempo que fornecem pistas para nos ajudar a perceber como chegámos aqui. Mas, no fim de contas, a nossa época não é melhor ou pior que outras; há características que a singularizam e marcam a geração que lhe dá corpo. Aqui ficam algumas notas repescadas no que se vai vendo e lendo, possível ajuda para ler a realidade e comunicar com os nossos contemporâneos.
Apesar dos grandes avanços e das inúmeras possibilidades, afinal o progresso não é infinito e as ideologias têm pés de barro. Diante de semelhante constatação, o pessimismo pode instalar-se, desalojando perspectivas de futuro. A isso se soma a grave crise económica que a todos afeta e deixa marcas. Por isso, alguém chamou ao nosso tempo a “época das paixões tristes”. Contudo, talvez a presente crise permita enfrentar a irracionalidade do consumismo e a colocar mais razão na tarefa educativa.
Marcados por um quotidiano precário, facilmente se observa o crescimento de uma “geração incrédula” e onde a “visão vocacional da vida” se dilui numa imediatez que é dominada pelo episódico e com carácter provisório. Fazemos parte de uma geração que tem medo de ficar de fora, de não saber as coisas, de não estar atualizada e, por isso, aumenta a dependência da internet, da violência e da falta de respeito pela privacidade.
As relações humanas também são marcadas por uma “visão utilitarista do leasing”, em objecto de uso enquanto serve para mudar logo que possível. O que leva a uma crise das relações baseadas na reciprocidade e no dom de si. Observa-se muita emoção, mas sem interação, passando-se facilmente da proibição à tolerância permissiva, enfrentando com dificuldade o quotidiano e caindo numa fácil tendência para escolher atalhos evasivos do “tudo e rápido” marcado por um narcisismo e dependência.
O individualismo observável, subjectivo e consumista, não permite ou favorece a descoberta dos outros e do Outro. A família deixou de ser uma realidade que exige posturas éticas e impõe comportamentos, passando a ser alguém que escuta e consente, não transmitindo ou ousando valores, ficando bloqueada diante de filhos belos, mas frágeis. Uma infância “passada entre algodões”, hiperestimulada, com poucos reflexos com o Outro, sem guia nem regra, faz aparecer nos mais novos um “sentido de omnipotência”.
Há uma falta de definição pessoal que se visualiza no sentir ético da consciência, onde se vive uma espécie de ecletismo hedonista, sem ideais absolutos. Numa linguagem informática, corre-se o risco de encarar a vida como realidade onde se pode entrar e sair sem compromisso.
Comissão Diocesana Vocações e Ministérios,
in VOZ DE LAMEGO, n.º 4301, ano 85/14, de 17 de fevereiro de 2015