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Bodas de Prata Sacerdotais | Pe. JOÃO ANTÓNIO TEIXEIRA

Pe. JOÃO ANTÓNIO PINHEIRO TEIXEIRA

J.António-25 anosO que a vida me ensinou e a missão me mostrou

25 ressonâncias de 25 anos

  1. O padre é o homem da Palavra e tem de ser um homem de palavra. A Palavra é a sua inspiração permanente e as palavras são o seu instrumento constante. Há muitas palavras que o padre não consegue calar, embora também haja imensas palavras que o padre jamais será capaz de dizer. Mais importante que as palavras que correm pelos seus lábios é a Palavra que escorre pela sua vida.
  1. O padre não tem de ser um falador, mas nunca pode deixar de ser um escutador. Antes de anunciar a Palavra, tem de saber acolher a Palavra. O silêncio é o fermento da comunicação. A oração é o alento — e o alimento — da missão.
  1. Afinal, a gaguez ajudou-me muito. Ser gago começou por ser um problema que se transformou numa lição. Aprendi que não se fala só, nem principalmente, quando se abre a boca. Fala-se também, e sobretudo, quando não se fecha o coração. O padre não tem de ser eloquente, mas tem de procurar ser coerente. O «logos vivencial» é muito mais interpelante que o mero «logos conceptual».
  1. A palavra escutada tem de ser a fonte da palavra proferida. A palavra não tem só uma função emissora. Deve ter, acima de tudo, uma função ressoadora. As palavras do padre existem para fazer ressoar a Palavra de Deus, a Palavra que é Deus.
  1. Calando ou falando, a palavra do padre nunca pode ser sobre si. Nem sobre o que foi nem sobre o que fez. Na Igreja, o padre não está no centro. O padre não pode ser o protagonista. Ele é pastor, mas não é patrão.
  1. Desde a ordenação, o padre opta por não ter uma existência própria. Nada nele é só ele. Tudo nele tem de ser Cristo. Desde o plano ontológico até ao plano existencial, não é o padre que vive, é Cristo que vive nele (cf. Gál 2, 20), e, por ele, em todos os que dele se aproximam.
  1. O padre não tem uma identidade alienada, mas uma identidade fortalecida. Em Cristo, o padre não é menos; é (muito) mais. Perdendo-se em Cristo, o padre nunca (se) perde.

  1. Tudo no padre tem de saber a Cristo. Tudo no padre tem de respirar Cristo. O padre está, definitivamente, tatuado por Cristo. Importante é que a realidade sacramental se repercuta no testemunho vivencial. O que o padre recebe no sacramento tem de se tornar visível na vida. A novidade de Cristo, como adverte Walter Kasper, está não na Sua mensagem, mas na Sua conduta. Jesus dizia o que vivia e vivia o que dizia. Na missão, a competência é muito, mas a vivência é tudo.
  1. Não creio que o padre possa ser outro Cristo. Pura e simplesmente, porque não há outro Cristo, embora perceba o sentido desta expressão atribuída a Hugo Grotius. Em tudo e sempre, o padre é Cristo. Tal como Cristo é a transparência do Pai (cf. Jo 14, 9), o padre há-de ser a transparência de Cristo. Só espalha Cristo quem espelha Cristo.
  2. Dir-se-á que ser Cristo é tarefa impossível. Sem dúvida. Mas o impossível para nós torna-se possível a partir de Cristo. Por isso, o padre tem de estar totalmente descentrado de si para estar plenamente recentrado em Cristo.
  3. Para o padre, a prioridade é estar com Cristo. Aliás, o Evangelho anota que, antes de os enviar em missão, Jesus quis que os Doze andassem com Ele (cf. Mc 3, 14). Para ser discípulo de Cristo, é preciso ser receptáculo de Cristo. Parafraseando Sto. Inácio de Antioquia, diria que todo o padre tem de ser «cristóforo», aquele que traz Cristo. Só quem traz Cristo pode dar Cristo.
  4. Todas as dependências são opressoras. Há, contudo, uma excepção: a dependência de Cristo. Só a dependência de Cristo é libertadora. O padre opta por ser inteiramente dependente de Cristo. Ser padre é ser, pois, «cristodependente».
  5. A «cristodependência» é a porta para aceitar até o que não tem aceitação justificável e a chave para compreender até o que não tem compreensão possível. O padre pode ser um incompreendido para muitos. E muitos arriscam-se a não ser compreendidos pelo padre. Só em Cristo conseguimos aceitar o que não compreendemos. Só em Cristo conseguimos compreender o que nos dói aceitar.
  6. Se o discípulo não é superior ao Mestre (cf. Lc 6, 40), é normal que a vida do discípulo esteja decalcada na vida do Mestre. Torna-se, portanto, compreensível que o padre seja acompanhado pelo (humanamente) incompreensível. Mas se a Cruz esteve presente na vida de Cristo, como é que poderia estar ausente da vida do padre?
  7. Para o padre, não se trata de sentir que a liberdade está condicionada; trata-se de assumir que até a (sua) liberdade é oferecida. Por muito paradoxal que pareça, não haverá maior afirmação de liberdade do que o acto de oferecer a liberdade. E nunca seremos tão livres como quando mergulhamos na nascente da liberdade: Deus.
  8. Para o padre, até o mais pequeno significante encerra um grande significado. O padre encontrará sempre Deus. Mesmo quando parece mais ausente, Ele acaba por estar presente. Ele está quando muitos se afastam, quando alguns agridem, quando tantos hostilizam. Podemos não ouvir sempre as Suas respostas, mas Ele nunca deixa de acolher o eco das nossas perguntas.
  9. O padre pode não fazer aquilo de que gosta nem aquilo que os outros apreciam. Acontece que o seu desígnio não é satisfazer-se a si nem agradar aos outros, mas servir a todos. Satisfazer e agradar não rimam com servir. A diaconia não é um exclusivo do diaconado. O padre serve para viver e vive para servir.
  10. Não existe autarquia ministerial. O padre não age em seu nome. Não é gestor de uma carreira nem promotor de interesses. Não está onde quer, mas onde é preciso. Daí que tão depressa esteja a chegar como possa estar a partir. O seu campo de trabalho é o mundo; a sua paixão é a humanidade; a sua única morada é Deus.
  11. Há coisas que um padre pode não entender. Muitas vezes, nem adianta esgrimir razões. Arriscamo-nos a tropeçar em eventuais «des-razões» nossas e em prováveis «sem-razões» alheias. No entanto, nunca perde a razão quem mantém a disponibilidade. De um padre espera-se acção, mas também rectidão, compostura, urbanidade. Não basta saber nem saber fazer; é fundamental saber estar. O padre deve mostrar o que é e ser o que mostra. Pode nem ser muito competente, mas tem de ser uma pessoa decente, em quem se possa confiar.
  12. Ao longo da vida, o padre vai coligindo muitos apontamentos e coleccionando não poucos desapontamentos. Nenhum desencanto, porém, obscurecerá o permanente reencantamento pelo Deus do povo e pelo povo de Deus. Se há decepções, também há consolações. Se é certo que sentimos longe alguns que considerávamos perto, também é verdade que nos sentimos perto de muitos que julgávamos longe.
  13. Um padre não deixa de ser humano e é vital que nunca seja desumano. Ele não deixa de ser homem quando sobe as escadas para a igreja. E não deixa de ser padre quando desce as escadas da igreja. Sempre homem, sempre padre. Um padre deve cultivar sentimentos evitando alimentar ressentimentos. É óbvio que um padre também se sente, um padre também sofre. O que o padre nunca deve é fazer sofrer. O padre deve estar ao lado, não dos causadores do sofrimento, mas das vítimas do sofrimento. Nem sempre terá respostas que aquietem todas as perguntas, mas deverá ter perguntas que inquietem muitas respostas.
  14. Os grandes pólos da missão estão no sacrário e na rua. Cristo está no templo e no tempo. Cristo está no pão e no pobre. Cristo subiu às alturas, mas continua a ser encontrado nas profundidades. Cristo também está em baixo. Cristo também está do lado de fora. É preciso saber sair para que muitos possam (re)entrar. Há, indiscutivelmente, muito que fazer. Mas, como prevenia Sebastião da Gama, há muito mais que amar. Há que amar humanamente a Deus. E há que (tentar) amar divinamente o próximo. Há verbos que o padre não pode conjugar: o verbo «impor», o verbo «explorar», o verbo «ofender». O padre só pode conjugar o verbo «servir», o verbo «dar» (sobretudo na forma reflexa: «dar-se»), em suma, o verbo «amar».
  15. O padre não pode ser imparcial. Ele tem de tomar partido. Não por partidos, mas pelo Evangelho, pelas pessoas. Os preteridos do mundo têm de ser os preferidos do padre. Um padre não é da direita, não é da esquerda, não é do centro; é do fundo. É da profundidade de Deus que ele nasce. É na profundidade do Homem que ele tem de estar. Junto de cada pessoa, o «ministerium patris (ministério do padre) tem de ser, cada vez mais, um «mysterium pacis» (mistério de paz).
  16. Nem todos os crentes podem ser padres, mas cada padre é chamado a ser, antes de mais, um crente. Ninguém lhe exigirá que atinja os cumes da mística, mas todos dele esperarão uma espiritualidade sólida e solidária. Tratar-se-á de uma espiritualidade que integre a Eucaristia (celebrada, adorada e testemunhada), a confissão frequente, o rosário quotidiano, a leitura e a meditação da Bíblia, o atendimento, etc. O que pede para fazer aos outros há-de procurar fazê-lo com os outros, pelos outros. A humildade e a simplicidade são o maior ornamento do padre.
  17. O padre não é credor, é apenas devedor. O padre não tem créditos, só tem dívidas. O que ele é deve-o a Deus, deve-o a tantos. O padre tem muito que pedir. Mas tem (infinitamente) mais para agradecer. Do fundo do meu coração, verto a mais sentida a gratidão: ao meu saudoso Pai, que já está no Céu, à minha querida Mãe, que continua a acompanhar-me na terra, ao meu Irmão, à minha Cunhada, aos meus encantadores Sobrinhos Pedro e João; todos eles são o meu reduto e o meu resguardo. Não esqueço o Pároco que me enviou para o Seminário nem o Bispo que me ordenou. Conservo gratíssima memória dos lugares por onde passei e das pessoas que conheci. Não é exequível elencar nomes. Mas estão todos gravados no meu coração reconhecido. Um sincero, extenso e muito intenso obrigado!

25, 5. Sobre o futuro? Direi tão-somente que tenho 25 vezes mais razões para continuar a entregar-me Àquele a quem me consagrei há 25 anos. Não sei obviamente quando vou morrer, mas sei que vou morrer padre. E isto para mim é bastante. É o bastante!

Edição impressa da Voz de Lamego

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