Semana da Cáritas: a Cáritas Diocesana de Lamego
In Voz de Lamego, 2014.03.18
De 17 a 23 de Março decorre a Semana Nacional da Cáritas. A esse propósito, D. Manuel Linda, o bispo português responsável por esta área pastoral, escreveu um texto, intitulado “Unidos no Amor, juntos contra a fome”, apresentando e definindo prioridades de actuação, ao mesmo tempo que convoca todos a participarem neste esforço de se conseguirem meios para ajudar os mais carenciados. Nesta semana fomos ao encontro da Cáritas diocesana.
O serviço da caridade é uma das vertentes da missão da Igreja. Como definir/apresentar a Cáritas na Igreja em geral e na nossa diocese em particular?
O serviço da caridade é a missão da Igreja. O rosto da Igreja, como o de Cristo, terá de espelhar a bondade e amor infinitos de Deus (quem é Deus em Si mesmo) por cada um dos homens. A Igreja exprime a sua íntima natureza no anúncio da Palavra de Deus, na celebração dos sacramentos e no serviço da caridade. Muito se fala de Deus, mas apenas Cristo é a sua plena revelação e nos mostra quem é. A Igreja tem de assumir este mostrar o Bom Deus, como Cristo o fez, como o grande Amigo que apenas quer o bem de cada homem. A Cáritas, mais de que uma instituição da Igreja, é a própria Igreja, sua «expressão irrenunciável». A Igreja diocesana é Caritas, Amor. Os recentes documentos da Igreja põem-no em evidência, explicitando o lugar dos pobres e da Igreja pobre para, na sua pobreza, revelar a riqueza (2Cor 8,9) dos que encontram a sua identidade em Cristo, no serviço, na doação àqueles que carecem desse estar e viver em Deus. A diocese de Lamego, implantada num território, empobrecido de recursos humanos (devido à fuga para os grandes meios e para o estrangeiro) e de iniciativas capazes de inaugurar uma nova época, sofre de uma espécie de anemia e de uma «resignação» que levam a aceitar como normal as suas limitações e a sua «pobreza» imposta.
Quais os principais apoios concedidos / serviços prestados pela Cáritas a quantos a procuram? Não concordo com a pergunta pelo que revela ou não revela sobre a Cáritas. Dar resposta a essa pergunta é como responder para que serve o anúncio da Palavra de Deus ou para que servem os sacramentos, realidades da nossa fé e da acção permanente do Espírito. É reduzir a Cáritas a um organismo, a uma ONG, quando Ela tem de ser a vida da Igreja, a Igreja na vivência do Amor de Deus, dado ao homem. Temos de organizar o serviço da Caridade, (Deus Caritas Est,nº29), mas essa organização passa pela resposta de cada crente, de cada comunidade, da Igreja diocesana. No motu próprio, Intima Eclesiae Natura distinguem-se os organismos de serviço de caridade que, nas Igrejas particulares, «cabem aos bispos, enquanto sucessores dos Apóstolos», dos que são iniciativa dos fiéis. A Cáritas Diocesana é o organismo da Igreja Diocesana («instituição promovida pela hierarquia eclesiástica») para «proporcionar» o ser caridade. Ela tomará as iniciativas, pontuais, necessárias às solicitações dos sofredores. Mas o papel, que a estrutura diocesana assume, tem a ver, principalmente, com a caridade nas diversas comunidades e a partilha de bens entre as comunidades, numa perspectiva sempre universal, não excluindo ninguém. A formação e animação de grupos paroquiais, a participação das comunidades na obtenção de fundos para dar o auxílio inadiável, a ajuda às comunidades pela estrutura coordenadora da diocese têm marcado o dia a dia da Cáritas Diocesana. Facilmente se depreende, que este «serviço» só será alcançável com a colaboração de todos, principalmente com a dedicação dos párocos e a prioridade que o bispo da diocese possa dar a esta manifestação essencial da vida eclesial. A reestruturação da pastoral sociocaritativa e a formação de grupos que, em rede, possam expressar a dinâmica do «conhecerão que sois meus discípulos se vos amardes uns aos outros» (Jo.13,35) pode e tem de tornar-se uma realidade vital e efetiva.
Como se concretiza a actuação da Cáritas no vasto território da Diocese?
Embora, de uma forma muito incipiente, aumentou a criação de grupos cáritas para o serviço de proximidade, nalgumas comunidades; fazem-se deslocações às comunidades para animação de grupos; os párocos atendem e procuram soluções para as situações das suas comunidades, recorrendo, quando necessário, à Caritas diocesana; muitos fazem chegar à Cáritas diocesana bens, quer alimentares quer de vestuário; um bom grupo de voluntários apoia o trabalho de atendimento, que o pessoal técnico desenvolve diariamente; anualmente dinamizam-se acções de sensibilização das comunidades, através da campanha dos Dez Milhões de Estrelas e do peditório Nacional; faz chegar a todos os párocos o material para a dinamização da semana e dia Cáritas; apoia o serviço de camas articuladas para famílias de fracos recursos; desenvolve o trabalho de ligação ao Fundo Solidário Nacional, iniciativa da Conferência Episcopal; em cooperação com a Cáritas Portuguesa tem distribuído senhas para bens alimentares, fornecidas por algumas empresas; com os Municípios desenvolveu o trabalho de parceria com os CLAS locais, para maior conhecimento dos problemas regionais; tem-se esforçado por participar ativamente na vida da Caritas Portuguesa, através da participação nos Conselhos Gerais, e abrindo-se às diversas iniciativas nacionais e estabelecendo parcerias.
Fala-se muito em “trabalhar em rede” e em “parcerias”. Como está a Cáritas Diocesana neste particular? Que sugestões para aperfeiçoar a articulação com as instituições locais?
É um caminho a percorrer. A Igreja Diocesana é detentora de um património extraordinário de Centros Sociais, quer através de instituições locais de Solidariedade Social, quer através das Misericórdias, além dos grupos paroquias organizados. A própria Diocese tem um Centro Social. Impõe-se que o trabalho desenvolvido, sem dúvida, altamente meritório, possa ser enriquecido com uma reflexão que torne estas estruturas representativas da comunidade local no serviço da Caridade e, que possam mesmo, alargar a sua ação a outras dimensões do serviço da caridade. Se o serviço da Caridade depende diretamente do bispo, creio que o arranque desta «parceria» deve contar com o impulso e empenho do bispo, promovendo uma verdadeira coordenação.
Que meios utiliza, ou não, a Cáritas Portuguesa para se fazer ouvir pelos governantes?
Não é uma pergunta para ser formulada à Caritas diocesana. No entanto é conhecida a postura de reflexão cristã sobre o contexto socio-económico da sociedade portuguesa, feita pela Comissão Justiça e Paz, e pela Comissão Episcopal para a Pastoral Social e Mobilidade Humana. O presidente da Cáritas Portuguesa, muitas vezes, é convidado a manifestar o pensamento e acção da Igreja. Ele próprio participa em reuniões específicas sobre problemas concretos da pobreza e situação social. A comunicação social tem estado atenta e reconhecido o papel da Cáritas Portuguesa, dando-lhe voz, em muitas situações.
A partir da procura que tem e dos serviços que presta, como se caracteriza a actual situação social da nossa região?
O atendimento diário evidencia o grande número de desempregados, a falta de meios para satisfazer as necessidades diárias de: alimentação, renda de casa, água, luz, livros, propinas, vestuário, medicamentos, óculos, etc; a procura de trabalho, de especial por parte de Jovens, e aceitação de qualquer trabalho mesmo quando a habilitação literária já é de nível superior; uma situação ou outra de condições impróprias de habitação, violência familiar; problemas de droga e alcoolismo, abandono escolar; embora raros, casos de sem abrigo; regresso às aldeias de pessoas que perderam o seu emprego nos grandes meios; falência de pequenas empresas de construção ou pequenos estabelecimentos ligados à cafetaria; falta de iniciativas, que proporcionem o desenvolvimento a partir dos recursos disponíveis (empreendorismo).
A solução de muitos destes problemas remete-nos para o programa do bom samaritano, o programa de Cristo «um «coração que vê» (Deus Caritas est, nº 32) e se compadece.